Na comunicação utilizada com os órgão de Controle de Tráfego Aéreo, há uma série de termos, padrões e fraseologia própria para tal. É interessante notar que uma vez que este modo de falar se torne natural para nós, é um tanto que complicado separar o nosso “avionês” de nossa linguagem comum do dia a dia.
O primeiro nível desse problema é quando você percebe que não consegue mais se desfazer do alfabeto fonético que já decorou. Sempre que algum atendente ou operador de telemarketing pede que você soletre seu sobrenome, por exemplo, você raramente fala “Ésse, Áh, Éle, Ê, Ésse”, ou muito menos utilizada palavras aleatórias, como “S de Santos, A de Abelha, L de Livro, E de Escola e S de Salmão”. Os que se atentam utilizam o alfabeto fonético intercalado, citando “S de Sierra, A de Alfa, L de Lima, E de Echo e S de Sierra”. Já os mais instintivos, por outro lado, acabam citando apenas o alfabeto fonético puro, e demora alguns segundos para entender por que o atendente ficou calado por alguns instantes, tentando compreender aquele idioma alienígena que foi proferido naquele momento.
O segundo nível através do qual você percebe que a aviação está totalmente indexada na sua vida, é quando você começa a utilizar outros termos de fraseologia em sua vida cotidiana sem perceber. Eu mesmo já passei por isso.
Certo dia estava almoçando com alguns amigos em um restaurante, quando a garçonete veio anotar nossos pedidos. Eis que quando chegou na parte das bebidas ela perguntou: “Vai querer açúcar e gelo no suco?”, e eu sem exitar solto: “Afirmo”… E a garçonete vai embora com um rosto que era a mistura de muitas expressões.
O nível mais profundo de influência da aviação na sua comunicação rotineira, é o ato de você começar a resumir ao máximo todas as informações que deseja passar, tal qual estivesse falando com um controlador em uma frequência congestionada.
Imagine-se ingressando – digo, “entrando” em uma livraria, onde uma pessoa normal poderia perguntar:
– Bom dia Senhora, estou procurando um livro sobre a Primeira Guerra Mundial, poderia me informar a sessão onde ficam os livros desse tipo?
Entretanto, um piloto notaria o quão de informações dispensáveis existem em uma frase como essa, e assim provavelmente escolheria dizer simplesmente:
– Olá, me confirme o local dos livros de história, por favor
E isso se ele for atento o bastante para se recordar do cumprimento e do agradecimento, vendo que na fonia isso também não é permitido.
Com isso, através das várias situações que vivi e presenciei, podemos concluir que:
Um piloto não avisa, ele reporta;
Um piloto não pede, ele solicita;
Um piloto não fica sabendo, ele fica ciente;
Um piloto não passa do lado, e sim no través;
Um piloto não confirma, ele afirma;
Um piloto não diz o horário de chegada, ele passa o estimado;
Um piloto não segue direções, e sim proas;
Um piloto não sobe, ele ascende;
Um piloto não entra, ele ingressa;
Um piloto não sai, ele livra;
Copiou? ;)
Sales
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