Um livro na sala de espera | Minha Proa: 029

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Mais de um século se passou desde a invenção do avião, e é impressionante e gratificante notar como, mesmo depois de todo esse tempo, os olhos das pessoas ainda brilham quando você revela ser um piloto.

Em certa manhã, eu estava na sala de espera de um hospital de Santos, onde fui levar um exame para o oftalmologista analisar. Como já de costume, eu levo sempre que possível algum de meus livros técnicos de aviação para passar o tempo, e assim também revisitar a matéria. No dia em questão, levei o meu livro de Conhecimentos Técnicos, de Denis Bianchini.

Alguns minutos se passam e mais pacientes começam a chegar, e a sala de espera logo fica cheia. Ao meu lado, sentou-se uma jovem de cerca de 20 anos, com óculos e cabelo na altura da nuca, juntamente com uma senhora por volta dos 50 anos, que acreditei ser sua mãe. Em uma sala onde a única distração era uma televisão, que exibia um programa matinal sobre saúde, ela começou a olhar ao redor e logo mostrou interesse pelo meu livro.

Ao ver as diversas figuras de motores e peças mecânicas, ela pergunta em um tom baixo para não incomodar os demais no silêncio da sala de espera:

– Você tá fazendo algum curso técnico?

– Não, só estou relendo esse livro. Ele é sobre conhecimentos técnicos de aviões – Digo mostrando a capa para ela e para sua possível mãe.

Com um leve ar de surpresa, levantando as sobrancelhas, ela completa:

– Ah, que legal, você quer ser piloto de avião? – Diz ela, ainda preservando o tom baixo da voz.

– Na verdade, eu já sou. Sou Piloto Privado. Comecei a voar com 17 anos.

Antes mesmo de eu finalizar a frase, a face dela mudou. O queixo caiu e ela ficou pasma, de boca aberta, e sem reação por cerca de cinco segundos. Fico olhando pra ela sem ter o que complementar. A expressão dela finalmente começa a formar um belo sorriso, de orelha a orelha. Ela logo toma fôlego, e solta:

– SÉRIO!? – Diz ela em um tom alto, quebrando o silêncio da sala de espera.

Não somente os demais pacientes, mas até mesmo a atendente do balcão, que ficava logo em frente à sala, olham pra ela curiosos sobre o que ocasionou aquilo. Após um toque no braço pela mãe dela, ela percebe e fica levemente sem graça. Para tentar manter a normalidade, eu simplesmente continuo a conversa.

Nos próximos minutos, falamos sobre os locais e aeronaves nas quais eu voava, citando desde as dificuldades para se tornar piloto, até a beleza que era sobrevoar o litoral, incluindo a cidade onde estávamos. Durante toda a conversa ela manteve um sorriso e olhos brilhantes, mostrando total interesse ao tema.

Fui chamado pelo doutor, e na saída da minha consulta, as duas possivelmente já estavam dentro de algum outro consultório.

É sempre bom notar como, mesmo após tantos anos, a admiração das pessoas pelo voo ainda se mantém constante.

Abraços,

Sales

Alexandre Sales
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