Aviação de garimpo: como tudo acontecia

Muitas vezes o combustível usado não era avgas, os pilotos não tinham carteira, o limite era algo ainda desconhecido, mas mesmo assim, muitos apostavam tudo nessa aviação. Por muitos anos o garimpo ditou as regras da aviação na região amazônica. Os garimpeiros eram extremamente ricos e queriam ter os confortos da cidade onde eles viviam. Nada mais justo. No entanto, como atravessar a floresta o mais rápido possível para levar algo de um lugar a outro? A resposta veio literalmente do céu: aviões começaram a ser trazidos de São Paulo e EUA, assim como os pilotos também. Mão de obra não era escassa. Demissão? Só por desistência mesmo, e o pagamento era à vista! Sistema perfeito, se comparado com a situação atual da aviação comercial no Brasil. Mas não se engane, nem tudo era um mar de rosas – aliás, era um mar de árvores!

Logo surgiram os primeiros problemas: Abrir pistas no meio da mata era uma reconhecível obra de engenharia, pois os garimpeiros precisavam achar terreno firme e plano no meio de uma floresta úmida e chuvosa. Mesmo com a melhor das pistas, pousar em um pontinho aberto no meio da floresta, sem chance pra erro, era algo digno de um porta aviões. Decidiu pousar, tem que pousar.

Durante anos foi assim. Milhares de pessoas sobreviveram, literalmente, pelo vai e vem dos pilotos em aeronaves como Corisco, Sertanejo, Carioca e Cessnas variados, e em aeronaves muitas vezes montadas de peças de outras. Precária ou não, a coisa funcionava e dava certo. O lucro beirava os 600%, e sempre havia um piloto disposto a arriscar tudo por um pouco mais, caso você não tivesse coragem pra fazer o serviço.

Mas com o tempo vieram as mazelas do risco. Centenas de pessoas perdiam a vida, e de outras até hoje não se sabe o paradeiro. Para se ter uma ideia, em uma simples pista local os pousos e decolagens chegavam a 200 ou 300 por dia – imagine isso em toda a região! Nem mesmo todos os centros de controle do Brasil juntos dariam conta de prover separação entre essas aeronaves voando visual.

Ao mesmo tempo em que era algo apaixonante e lucrativo, era algo covarde. E ficou muito mais covarde quando o garimpo foi enfraquecendo, a demanda diminuindo e a oferta aumentando. Qualquer um que entenda um pouco de comércio sabe o que acontece em seguida. Os garimpeiros começaram a pagar menos, e com sobra de pilotos, também se começou a disputar as viagens. O resultado foi uma grande queda nas condições dos voos, pois topando-se qualquer desafio, os riscos aumentavam.

Esse foi o fim trágico da velha aviação de garimpo na Amazônia, juntamente com o próprio garimpo que foi proibido em quase todas as áreas antes exploradas.

A partir daí as pessoas começaram a perceber que não era só o ouro ou diamante que importavam naquela região. Muito mais valioso que isso era a biodiversidade da Amazônia, e a cultura nela arraigada e mantida por dezenas de anos. Pessoas precisavam ser ajudadas, coisas precisavam ser descobertas e muito tinha que ser aprendido. Só uma coisa não mudava: o meio!

Eduardo Mateus Nobrega
Redes
Latest posts by Eduardo Mateus Nobrega (see all)