Hidroaviões: quando a água não é a melhor opção

Eventualmente é possível ouvir reclamações sobre o pavimento desta ou aquela pista: muita borracha, ondulações, desníveis e etc. Mas e quando se voa um hidroavião? Não faz o menor sentido reclamar da pista ou das condições da mesma. Um piloto que voa uma aeronave que usa a água para pouso ou decolagem precisa se preocupar não só com as condições do tempo, mas também com as da superfície da água e as correntes no seu meio. Aí reinam outras regras sobre a teoria do voo. Decolar contra a corrente é o mesmo que decolar em pista com aclive, e quando o fizer em rios, é necessário saber que ele não está livre do F.O.D., nem foi feita nenhuma inspeção para a decolagem ou pouso. Encontrar um tronco, barranco de areia, animal ou algo do tipo no meio do procedimento é de certa forma esperado.

Isso tudo vai influenciar em todos os detalhes do voo, como por exemplo autonomia e planejamento. Se um piloto decola de uma localidade, e mesmo com condições do tempo consideradas ótimas encontra um rio, lago ou mar muito agitado e com corrente desfavorável ao pouso, sem dúvida vai precisar voltar para onde veio, ou alternar pra algum lugar que comporte sua aeronave e dê segurança ao procedimento. Será exigido um planejamento minucioso e uma autonomia bem acima da média, para que se possa lidar com uma situação assim.

Existem relatos de pilotos que, em função de uma emergência, precisaram alternar por condições adversas de pouso, e o fizeram numa área com superfície de água tão pequena que não era possível mais a decolagem, sendo necessária a desmontagem quase completa do avião para remoção dele do local. Indo mais além, e desta vez sem fontes confiáveis ou provas documentadas, conta-se que alguns pilotos muito habilidosos, em emergência, fizeram pousos em piscinas grandes, sendo novamente necessária a desmontagem da aeronave.

Deste modo e a partir desses pontos, é preciso se refletir muito bem quando se opta por utilizar um hidroavião no lugar de uma aeronave terrestre. Existem claras vantagens de acessibilidade, e essas são muito importantes em determinadas regiões e situações. Mas os desafios da operação são muito grandes: não só uma nova habilitação é requerida (e claro, um novo treinamento), mas também habilidades e padrão muito acima dos que são exigidos naturalmente – habilidades essas que já não são tão naturais assim.

Faço uso de uma frase dita por um piloto muito experiente, há uns anos atrás: “O homem não foi feito pra voar, e sim andar, e muito mal. Quanto mais além você for disso, mais cuidado e trabalho deverá ter”. Voar já é uma coisa bem fora do nosso “normal”. Pousar uma aeronave a 120 km/h sobre uma pista já é um desafio, fazê-lo sobre a água se faz um desafio muito maior, e algo que foge bem mais do nosso normal. Consequentemente, é preciso aceitar os novos riscos e se preparar de forma diferente para isso.

Eduardo Mateus Nobrega
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