Um acidente nunca será causado por um só fator isolado, mas sim, por uma cadeia de fatores normalmente isolados que se unem para formar a oportunidade do acidente. Isso nos leva a questionar as famosas afirmações de que tal acidente aconteceu por isso ou aquilo. Olhando pela visão dessa frase, é impossível dizer que um acidente ocorreu somente por erro do piloto, ou por apenas uma peça fora do lugar. Isso é uma ilusão.
Mas então, como se evita que esses “fatores alheios” se unam e formem um acidente? Na aviação, nós ilustramos como filtros as diferentes políticas de segurança nos diferentes campos de tarefa. Isso quer dizer que os trabalhos do piloto, do mecânico e do despachante consistem em fazer sua obrigação, e também, criar barreiras operacionais para evitar a ocorrência de um acidente. Dessa forma, pode não ser possível impedir que uma falha ocorra nas inúmeras tarefas do voo, mas com certeza, fica muito mais difícil que essa única falha se una a outra e gere algo irremediável ou “não mais filtrável”.
Saber por que um avião cai é justamente tentar entender quais filtros não funcionaram, quais setores permitiram que as falhas se encontrassem e gerassem uma falha maior, expondo a aeronave ao perigo. Utilizemos um breve exemplo: Em meados de 2011, duas aeronaves Supertucano A-29 da Força Aérea Brasileira caíram em Boa Vista, Roraima. Uma dessas aeronaves bateu contra uma torre de telefonia a menos de 90 metros de altura, e caiu em um terreno abandonado como último esforço do piloto.
Posteriormente, avaliando o acidente para entender o que o ocasionou, percebi três fatores distintos. Obtive uma informação não oficial de que as duas aeronaves retornavam de treinamento já com poucos litros de combustível nos tanques. O clima estava dos piores, totalmente IMC, sem condições para pouso mesmo em regras IFR. Isso forçou as aeronaves a voarem abaixo do teto no momento, em espera e com muito pouco combustível. Observando esses três fatores críticos, e tomando como verdadeira a informação não oficial, é possível compreender totalmente como foi possível que acontecesse esse acidente.
Nesse caso, ironicamente seria mais difícil responder por que esse avião não caiu, se ele tivesse conseguido pousar. Perceber todas as causas de um acidente é a forma mais segura e exata para dizer por que um avião cai. Determinar os fatores por uma fonte certa, e olhar onde esses fatores surgiram, pode responder à pergunta tema desta série muito facilmente.
Nos próximos dias, vamos perceber não mais como avaliar a causa de uma acidente, mas sim como qualificar essa causa, pois existem fatores que ocorrem com frequências e intensidades diferentes. Poderemos dizer que se algo tende sempre a dar mais errado que outras coisas, é um erro a não se cometer.
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