Conto – Ultraleve na Praia

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   Com emoção ou sem? Era a pergunta feita para o passageiro dos voos panorâmicos na praia do Pontal do Sul – PR. Caso a escolha fosse mais conservadora, decolava suavemente até alcançar uns 300 pés, e voava rumo norte para uma vista melhor da Ilha do Mel.

  Já se a opção fosse produzir adrenalina, subia em círculos sobre o campo e depois de alcançar os 3000 pés, iniciava uma série de evoluções acrobáticas rumo ao chão. Todas as manobras eram executadas de forma segura, embora devidamente acompanhadas pelos berros histéricos da vítima voluntária.

  A “perda” é a manobra preferida por 10 entre 10 aviadores espíritos de porco como eu. Levanta-se o nariz da aeronave até que ela deixe de voar. A gravidade faz o resto. Ou melhor, a ausência dela cuida do resto. O súbito movimento de pêndulo faz a paisagem de céu azul mudar para uma terra girando em apenas 2 ou 3 segundos. O frio na barriga é certo uma vez que os órgãos internos estão pensando em subir enquanto o resto do corpo vai descer.

  Assim como o manual da felicidade prega, meu hobby dava mais dinheiro que meu trabalho. Voar de ultraleve na praia é um sonho para poucos, e ganhar dinheiro com isso, menos ainda.

  A rotina, se é que se pode chamar assim, era basicamente a mesma. Acordava às seis da manhã, pegava o equipamento, ia até as pedras do cais e fazia caça submarina até conseguir alguns bons peixes. Quando não arpoava nada de qualidade, capturava uma ou duas lagostas e trazia para Dona Tereza, cozinheira e proprietária do hotel onde estávamos hospedados. Ao voltar já encontrava o café da manhã pronto, o qual, não demorava em ser devorado pelo piloto mergulhador que lhes escreve.

  Pronto para começar o dia em outros ares (literalmente), me dirigia até o campo de pouso à beira da praia. Uma área de 100 por 100 metros gramada e com um hangar adequado para três aeronaves leves. O fácil acesso pela estrada e a proximidade com o mar, trazia muitos turistas curiosos com a movimentação que os pousos e decolagens daqueles pequenos aparelhos voadores.

  O primeiro voo da manhã era para atrair os veranistas. Uma faixa presa na parte de baixo da asa esquerda anunciava o passeio. Na volta, a missão era bombardear a praia com folhetos do hotel com uma bala “Sete Belo” grampeada. A propaganda criativa descia girando devagar e em poucos minutos desapareciam ecologicamente das areias, capturadas pelas crianças que acenavam alegremente.

  Ao pousar, Fabiane já havia convencido pelo menos meia dúzia de pessoas a pagar 25 dólares pelo voo de 10 minutos.

  A baixinha chamava atenção onde estivesse. Morena de cabelos longos e corpo absolutamente perfeito era uma atração à parte. Não havia quem encontrasse algum defeito nela. Seu sorriso branco encantava até a alma mais dura. O olhar meigo, enfeitado pelos grandes cílios, enganava quem imaginava que fosse uma menina inocente. Usando o charme e um biquíni minúsculo, para mostrar as curvas naturais, ela era imbatível para convencer o mais resistente negociador ou passageiro receoso e em dúvida sobre a segurança do passeio.

  Chegava a voar por 8 horas seguidas, mas como diz o ditado: o que é do gosto arregala a vida. O único inconveniente de mergulhar e voar seguidamente é uma rara alteração do labirinto, órgão responsável pelo equilíbrio, que fazia com que eu enjoasse quando estava em terra firme.

  Meu ambiente natural continua sendo o mar ou o ar. No chão eu tenho vertigens, tonturas e enjoos. Deveria ter nascido gaivota.

  Eventualmente, para atrair passageiros, meu parceiro pilotava em círculos sobre o campo até os 3000 pés onde eu saltava de paraquedas. Pousava no campo depois de fazer manobras radicais que chamavam a atenção de possíveis passageiros. A estratégia era excelente. Alguns minutos depois já se formava uma fila de turistas ansiosos pela experiência de voar sentindo o vento no rosto.

  O próprio ultraleve que eu usava era bastante chamativo. Um QuickSilver “asa aberta” amarelo e com as pontas das asas coloridas. Embora de aparência frágil, o aparelho é incrível para aviação recreativa e também muito seguro.

  O ar mais denso do nível do mar e o vento constante aumentam a segurança dos voos. Em breve iríamos começar a instrução de voo noturno sem instrumentos. Mas isto já é outra história…

Franco G. Rovedo
franco.rovedo@gmail.com

Renato Cobel
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