Valor Agregado

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Na época do voos panorâmicos na praia, havia inexplicáveis períodos de pouco movimento. Ficávamos horas sem nenhum intrépido passageiro. Depois de estudar a questão, chegamos a algumas conclusões que mereceriam um estudo antropológico aprofundado. Tudo baseado em estatísticas tiradas depois de milhares de passageiros atendidos.

Por estarmos ao lado de uma praia de casas luxuosas e condomínios caros, imaginávamos que a juventude viria em peso experimentar a maravilhosa sensação de voar sobre o mar e a linda vista de seu balneário.

Não era bem isso que acontecia. Em primeiro lugar o que mais estranhávamos era que a proporção de meninas e meninos que faziam os voos era muito desigual. Mas muito mesmo. Coisa de 10 para 1. Dez meninas para cada menino. Era de se esperar o contrário. Na teoria, os meninos seriam mais corajosos e compelidos a experimentar aventuras que contivessem velocidade e emoção. Nada disso. Os rapazes chegavam até o campo e ficavam apenas olhando e rindo, geralmente com uma cerveja na mão. Desdenhavam o modelo do avião, a roupa do piloto, as instalações, o campo, enfim… Tudo que pudesse ser desprezado era, e em seguida partiam sem fazer o voo. Uma pequena parcela deles se arriscava a fazer o passeio e de preferência o mais tranquilo e nivelado possível.

Para lhes dar confiança, passava os comandos em voo para o passageiro, explicando como manobrar com a aeronave. Achava que isto atrairia os amigos e aumentaria a clientela. Também não deu certo. Assim que pousava, o rapaz saia esnobando os outros e fazendo de tudo para desencorajá-los a tentar.

Já as meninas, compareciam em turma e com o dinheiro na mão. Quando eu perguntava para a passageira se queria o voo com emoção ou tranquilo, a grande maioria pedia todas as acrobacias possíveis. Evidentemente acompanhadas de berros histéricos que seriam ouvidos até lá embaixo. Não raro, a garota aparecia novamente para outra sessão de manobras acrobáticas novamente acompanhadas de berros mais fortes que o barulho do motor. Tudo bem para mim, o que importava era faturar.

Certa manhã, voando com um rapaz de uns 15 ou 16 anos, sobrevoamos uma casa do balneário vizinho. A mansão possuía uma grande piscina e ao redor dela percebemos várias moças tomando banho de Sol. O rapaz sorriu para mim e pediu para eu voar mais baixo. Neguei, pois o tempo do voo estava terminando e tinha outros passageiros já na fila.

Uma hora mais tarde, o mesmo garoto apareceu com três amigos prontos para voar. Ele foi primeiro e pediu para que eu fosse direto para a mansão, voando baixo de preferência. Na primeira passada rasante, já percebemos todas as moças tomando Sol sem a parte de cima do biquíni. Algumas protegiam os seios com um dos braços e acenavam divertidas com a nossa intrusão aérea.

Sobrevoei a casa por alguns minutos e voltei para o campo. Repeti a missão com os outros três garotos e assim que pousei com o último, já havia uma fila de rapazes de idade semelhante, prontos para a aventura. A cada incursão, as meninas da casa ficavam mais a vontade com nossa presença. Algumas já não se davam ao trabalho de esconder seus belos seios, o que tornava o voo panorâmico mais lindo ainda.

Aquele dia inteiro foi praticamente dedicado àquela categoria de passageiro que antes não me davam lucro. Agora, os voos eram mais curtos e seguros, pois voava poucas centenas de metros até o balneário vizinho, circundava a casa algumas vezes e voltava para apanhar mais um entusiasmado aventureiro.

Claudio, meu parceiro e piloto, também gostou muito da nova rota, de forma que revezamos o dia todo. Foram quase cinquenta voos seguidos.

Cansado, porém animado com o resultado financeiro do dia, terminamos os passeios um pouco antes do por do Sol, guardamos tudo no hangar, pegamos o carro e nos dirigimos até o hotel onde ficávamos hospedados.

No caminho, fiz um desvio, entrando no balneário ao lado do campo.

– Ué? Onde você está indo? – Cláudio perguntou, estranhando a mudança de rota.
– Estou indo pagar a comissão combinada com minhas parceiras e promotoras de vendas – Respondi orgulhoso comigo mesmo por haver estudado marketing de serviços e saber onde as artistas do cabaré local passavam o final de semana.

Franco Rovedo
franco.rovedo@gmail.com

Renato Cobel
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