E aí Cmtes, tudo tranquilo? Maravilha!
Dando continuidade com os relatos por aqui, mesmo em fase de mudança no blog, hoje trago até vocês o relato da minha primeira navegação, que teve por destino a cidade de Ourinhos, em São Paulo. Espero que apreciem o relato ;) Sem mais demoras na escala, vamos para o texto!
Após ser aprovado no “checkinho” da fase de aperfeiçoamento (AP), comecei a realizar a última etapa do curso prático, que consiste em 03 navegações: duas navegações curtas, com duração de 1h cada perna, totalizando 2h de voo no total, e uma navegação longa, com aproximadamente 3h de voo total.
Para fazer a navegação, é preciso planejar a viagem, traçar a rota e procurar por pontos de referência para verificar se você está mantendo a rota correta. Esta é a chamada navegação visual e estimada, pois você voa com base em referências no solo (cidades, pontes, rios, represas, etc.) e estimando seu tempo de voo até as referências com base na velocidade de cruzeiro do avião.
Durante o curso teórico de Piloto Privado, nas aulas de navegação, aprendemos alguns exercícios de navegação, porém, nos exercícios, apenas traçávamos a rota, estipulávamos a distância e o RM a ser mantido e calculávamos alguma influência do vento, bem como o tempo de viagem e a autonomia.
Eram exercícios complexos, demorados, que levavam praticamente 1h para serem feitos e que quase sempre fazíamos simulando aeronaves de grande porte, como Boeings e Airbuses da vida. Então eu tinha uma boa base para planejar a minha navegação, mas como não tinha certeza de como prepara-la corretamente, combinei com o pessoal das Operações do Aeroclube que me ajudassem com isto.
Como sou de fora de Londrina, ir para lá só para planejar a viagem é algo muito desgastante, além de ser caro também. Por este motivo, pedi para que marcassem um horário mais para o fim da tarde para que eu fizesse a navegação, e com isso, chegaria bem mais cedo para poder planejá-la.
Deu certo então de marcar o voo para um domingo, dia 04/12, às 16h30min. Sim, era a final do Brasileirão e eu nem vou comentar mais sobre isso, hahaha. Enfim, cheguei de manhã no aeroclube, por volta das 10h.
Como ninguém havia me falado nada sobre os materiais necessários para o voo, peguei os que sabia que iria utilizar, que era o computador de voo, a régua de navegação e o transferidor para navegação. Eu também sabia que precisaria de um mapa, mas pensei que ele fosse disponibilizado no aeroclube.
E eu estava certo, porém era domingo, e a parte comercial não abriria. Fui até a sala de briefing e achei um mapa plastificado, ideal para usar. Peguei e fui até a sala de operações para que alguém me instruísse no planejamento. Como o mapa era plastificado, era possível usar canetinha para traçar a rota, o problema é que quem anda com uma canetinha na mochila??
Então aquele mapa não me seria útil, eu precisaria de um de papel mesmo. Foi então que o salvador da pátria apareceu. O Cmte. Renato, que estava na Operações aquele dia, me emprestou o mapa dele, para que eu fizesse o planejamento e utilizasse durante o voo.
E foi ele também quem me ajudou no planejamento do voo, me explicando como era feito, os cálculos que seriam utilizados e as marcações necessárias. Tracei a rota e comecei os cálculos. A distância de Londrina (SBLO) para Ourinhos (SDOU) é de aproximadamente 72NM. O RM que teríamos que manter era o 087 (70 + DMG de 17ºW). Desta forma, teríamos que manter um FL ímpar, já que estaríamos voando no 087 e pela tabela de FL, o 087 deve ser voado em um nível ímpar. Abaixo tem a tabela para entenderem melhor:
Definidos o rumo de ida, o FL e a distância, procurei no ROTAER os dois aeródromos para tirar as informações necessárias para o voo, como tamanho da pista de cada aeródromo, frequências, elevações, posição do AD em relação ao centro da cidade, etc.
O aeroporto de Ourinhos (SDOU) fica a 4Km NW do centro da cidade, sua pista tem 1500x30m, revestimento de asfalto, operando cabeceiras 16 e 34. A elevação é de 1532 pés, arredondando sempre para a próxima centena, 1600 pés para calcular a altitude do circuito de tráfego, que seria 2600FT, isto é, 1000FT AGL (Above Ground Level – Acima do nível do solo).
Escolhi o FL055 para ir até Ourinhos, uma vez que o 035 seria muito baixo e o 075 um pouco alto para o horário do voo (fim da tarde). As referências seriam as cidades de Jataizinho, Uraí, Cornélio Procópio, Santa Mariana, Bandeirantes, Andirá, Cambará e finalmente Ourinhos.
Com base nas velocidades e R/S (Razão de Subida) R/D (Razão de Descida) do C150 e C152, calculei os tempos necessários para atingir cada uma dessas referências. Para a subida até o TOC (ponto de atingimento do nível de cruzeiro – Top of Climb se não estou enganado), a velocidade é de 70MPH e a razão é de 300ft/min.
Com base nisso, nossa subida demoraria em média de 12 minutos e percorreríamos 14NM. Desta forma, estabilizaríamos em cruzeiro no ponto médio entre Jataizinho e Uraí. Em seguida passaríamos na vertical de Cornélio Procópio e Santa Mariana. Logo após passar esta última cidade, estaríamos no limite da TMA Londrina.
Então passaríamos a vertical de Bandeirantes, à direita de Andirá e a esquerda de Cambará e iniciaríamos a descida a 6 minutos de SDOU, isto é, a 9NM. Já a volta seria praticamente a mesma coisa, com os mesmos pontos de referência, só mudando o RM, que agora seria o 267 e o FL que seria o 045. Abaixo vocês conferem a imagem do planejamento:
Assim que terminei o planejamento, fui preparar o Plano de Voo completo (necessário para voos que vão além da TMA Londrina) e a ficha de peso e balanceamento da aeronave. A aeronave seria o PR-VAT e o instrutor seria o Abílio novamente. Preparados todos os documentos e feito todo o planejamento, passamos o plano de voo para o horário marcado na escala, 16:30 local, 18:30Z.
Como ainda era perto das 13h, fui almoçar no tradicional restaurante em frente ao aeroclube. Fiquei uma hora por ali, curtindo o vento que fazia na cidade “inferno” de Londrina. Diz a lenda que o diabo se mudou de lá e foi pro inferno porque Londrina era quente demais… hahaha.
Enfim, quando foi umas 14h voltei até o aeroclube e fiquei por ali estudando a rota, analisando os pontos de referência e conversando com os Cmtes que por ali estavam. Não me lembro do nome deles agora, até mesmo porque não sou muito bom com nomes, mas foi um papo legal.
Chegando perto da hora do voo, o VAT tinha acabado de pousar e então fui até lá para fazer a inspeção pré-voo e verificar se estava tudo ok. Feito isso, sem nada a acrescentar, enchemos o tanque do VAT e fomos para o briefing do voo. Durante o nosso briefing, expliquei ao Abílio a nossa rota, informando velocidades, tempos e pontos de referência. Feito isso, ele me perguntou sobre a previsão do tempo, se havia alguma informação de NOTAM para o aeródromo de destino e alguns telefones para caso de emergência.
Como ainda havia um tempo antes do voo e do plano de voo entrar em vigor, fui até a estação do piloto para imprimir as informações. Feito isso, guardei as coisas no avião, peguei todo o material necessário para voo e deixei ao meu alcance na cabine. Peguei o diário de bordo e documentos necessários, a chave do avião e partimos para o voo. Ouvi o ATIS em Londrina na frequência 127.67MHZ. Tudo ok, céu CAVOK, vento alinhado e de média para fraca intensidade. Perfeito para voar. Já com tudo em mãos e com o plano já vigente, chamei a torre em 118.40MHZ:
– Torre Londrina, boa tarde. PR-VAT.
– PR-VAT, torre Londrina, boa tarde. Prossiga.
– O VAT está no pátio do aeroclube, ciente da S. Solicito acionamento e cópia para voo de navegação até SDOU.
– Ciente VAT, decolagem pista 13 com curva a esquerda após, suba até o FL055. Acione 3341. Após decolagem, controle Londrina em 129.70MHZ.
– Decola da 13 com curva a esquerda, autorizado até o FL055. Transponder em 3341. Controle Londrina em 129.70MHZ. PR-VAT.
– VAT cotejamento correto, acionamento a critério, informe pronto para táxi.
– Informarei para taxi, VAT.
Depois de realizada a fonia, efetuamos o check de acionamento e pós-acionamento e informamos pronto para o taxi.
– Londrina, PR-VAT pronto para táxi.
– VAT, taxi autorizado até o ponto de espera pista 13.
– Taxi até o PE da 13, VAT.
Como estava sem muito movimento naquela tarde, fomos autorizados diretos ao PE. Normalmente a torre pede para informar ingressando do pátio principal do aeroporto, mas desta vez passamos direto. Já no PE, efetuamos o check de motor e tudo estava dentro dos padrões, então informamos prontos para decolar.
– VAT pronto no PE da 13.
– VAT, autorizado alinhar e decolar pista 13. Vento 130/04kt, QNH 1012.
– 1012, livre decolagem. VAT.
Ingressamos na pista e alinhamos. Conferimos a bússola para ver se estava coerente com o eixo da pista e tudo certo. Apliquei potência gradativamente até o máximo e começamos a rodar. Perto das 40 MPH, atingimos os mínimos para decolagem e aguáramos a VR de 60MPH.
Atingindo 60, comecei a puxar o manche devagar para que o VAT saísse do solo suavemente e ganhasse velocidade para a subida. Como estávamos muito pesados por conta do combustível, se puxasse de forma mais brusca, poderíamos estolar sobre a pista. Fora do solo, ganhamos velocidade e estabilizamos em 70MPH para subir até o 055.
Assim que livramos o eixo, da pista, iniciamos a curva para a esquerda para interceptar a radial que nos levaria até Ourinhos. Então a torre nos comunicou:
– PR-VAT, decolado aos 40. Chame controle em 129.70. Bom voo e até o retorno.
– 129.7, VAT. Obrigado e bom trabalho.
Mudei a frequência e chamei o controle:
– Controle Londrina, boa tarde, PR-VAT.
– PR-VAT, boa tarde, controle Londrina. Suba para o 055 sem restrição. Informe atingindo.
– Subindo até o 055. Informarei atingindo.
Terminada esta parte, pedi para que o Abílio assumisse o controle da aeronave e a fonia por um momento para que pudesse fazer as anotações de horários e estimados. Peguei então o mapa e a folha de planejamento e anotei o horário da decolagem. De acordo com o planejamento, atingiríamos o TOC em 12 minutos, isto é, aos 52 da presente hora.
Também aproveitei para calcular o estimado para livrar a TMA Londrina e para chegar em SDOU. Tempos calculados, assumi novamente o comando da aeronave e fiquei de olho nas referências pelo caminho. Logo que assumi o comando novamente, o controle nos chamou:
– PR-VAT, estimado para livrar a TMA Londrina e para TGL em SDOU?
– VAT estima mais 30 minutos para livrar a TMA e 56 para toque em SDOU.
-Ciente, 30 para livrar a TMA e 56 para SDOU.
Quando o órgão de controle pede o estimado, é sempre importante informar em horário, e não em tempo. Por exemplo, ao invés de fazer como fiz, informar em tempo (30 minutos), é importante informar em horário (no caso, se decolamos aos 40, mais 30 minutos, isso daria aos 10 da próxima hora.
E sempre informar em horário Zulu. No caso, estimado para livrar a terminal as 19:10). Isso facilita o trabalho deles. Porém, como não sabia deste detalhe, informei em tempo e o Abílio depois me avisou que os estimados eram sempre em horário. A não ser que o órgão peça algo como: “VAT, estima Londrina em mais quantos minutos?”.
Nivelamos um pouco mais tarde do que o planejado, por conta de estarmos mais pesados que o normal. Porém, nada de muita diferença. Nivelamos próximos de Uraí. Assim que atingimos, informamos o controle, conforme orientado:
– Controle, o VAT atingiu 5500 neste momento.
– VAT, Controle ciente.
O voo estava bem tranquilo, sem turbulência ou vento para atrapalhar. As referências estavam todas visuais e era possível identifica-las sem dificuldade. Logo que passamos Santa Mariana, informamos o controle que estávamos a 5 minutos de livrar a TMA Londrina. Então o controle nos autorizou mudar a frequência para o Centro Curitiba e chamar para regresso.
Mudamos nossa frequência e ficamos na escuta de qualquer aviso. Tudo correu sem problemas até SDOU. Quando estávamos 5 minutos fora do aeródromo, deixamos a frequência do Centro Curitiba e acionamos a frequência livre, em 123.45MHZ para fazer a coordenação de tráfego.
– Para coordenação de tráfego em Ourinhos, PR-VAT, proveniente de Londrina, está mantendo a radial 087 no nível de voo 055, descendo para a altitude de tráfego do aeródromo. Alguma aeronave na área para coordenação?
Não obtivemos resposta, então isso significava duas coisas, ou não tinha ninguém na área ou se tinha, estava com o rádio desligado. Iniciamos a descida para 2600 pés, para entrar no circuito de SDOU. A intenção era cruzar o aeródromo para visualizar a biruta e verificar a direção do vento.
Chegando próximos do aeródromo, decidimos não cruzar, e sim entrar na perna contra o vento da pista 16. De lá, observamos a biruta e descobrimos que a pista em uso era a 16. Então coordenamos novamente:
– Para coordenação de tráfego em Ourinho, VAT na perna contra o vento da pista 16. Executando circuito padrão para toque e arremetida.
Novamente o silêncio permaneceu e continuamos o circuito. Girei para a perna de través e informei novamente na coordenação, assim como na perna do vento. Começamos a girar base e fiz os checks de aproximação e pouso. Logo, ingressamos na final da pista 16. Como não estava acostumado com o aeródromo, não sabia o ponto certo para tirar o motor.
No fim das contas, acabei aproximando meio alto e rápido, e por conta disso, decidi arremeter no ar e fazer o circuito novamente. Assim o fiz, e desta vez, acertei a aproximação. Toque suave e alinhado na pista 16 de SDOU. Após o toque, curvamos à esquerda para efetuar a saída padrão e voltar para Londrina na radial 267.
Pedi para que o Abílio assumisse novamente o comando da aeronave e anotei os horários para fazer os novos estimados. Feito isso, retomei o controle e voltamos para Londrina. Antes de deixar o aeródromo, coordenamos na livre:
– PR-VAT, livrando o circuito de tráfego de Ourinhos, iniciando subida para 4500 pés, mantendo a radial 267.
A subida foi bem tranquila, porém o Sol estava batendo bem de frente, restringindo um pouco a visibilidade da cabine, mas nada que atrapalhasse o voo. Atingimos 4500 em poucos minutos e voltamos para Londrina. Há 5 minutos fora de SDOU, mudamos para a frequência do Centro Curitiba novamente até chegamos perto da TMA.
Neste meio tempo, próximo à cidade de Bandeirantes, cruzamos com uma aeronave a uns 500 a 1000 pés acima. Não havíamos ouvido nada sobre tráfegos na região, mas ainda bem que não passou de um “susto”. A 5 minutos de entrar na TMA Londrina, escutei o ATIS e chamei o Controle:
– Controle Londrina, boa tarde. PR-VAT retornando de Ourinhos, mantendo 4500 pés na magnética 267, ciente da U, estimo mais 5 minutos para ingressar na sua terminal.
– PR-VAT, controle Londrina ciente, reporte ingressando na TMA.
– Reportarei ingressando, VAT.
No meio do caminho entre Bandeirantes e Santa Mariana, chamei novamente informando o ingresso na área da terminal:
– Controle, VAT ingressando na sua terminal, estimando Londrina aos 45 da presente.
– Ciente, VAT, estimado para Londrina aos 45 da presente, informe no ideal de descida.
– Informarei no ideal de descida, VAT.
Nosso toque em Ourinhos tinha acontecido às 19:45Z e nosso pouso em Londrina estava estimado para as 20:45Z. Próximos de Jataizinho, iniciamos a descida e comunicamos o controle:
– VAT no ideal de descida.
– VAT, desça para a altitude de tráfego de Londrina. Reporte na vertical de Ibiporã, temos dois tráfegos retornando da área de instrução, um já está na frequência da torre e o outro está retornando para a vertical de Ibiporã.
– Ciente, descendo para a altitude de tráfego e ciente dos tráfegos.
Começamos a descida e ficamos atentos aos tráfegos no local. Assim que atingimos a vertical de Ibiporã, informamos o controle:
– Controle, VAT na vertical de Ibiporã.
– VAT, ciente, atento ao tráfego que reportou a vertical de Ibiporã recentemente, prossiga para a perna do vento da pista 13. Chame torre em 118.40.
– Atento ao tráfego, vai ingressar na perna do vento da 13, VAT. Chamando torre em 118.40, boa tarde e bom trabalho.
– Grato.
Sintonizamos a frequência da torre em chamamos para novas autorizações:
– Torre Londrina, PR-VAT na vertical de Ibiporã, seguindo para a perna do vento, pista 13.
– VAT, torre ciente. Informe ingressando na perna do vento.
– Informarei.
Assim que ingressamos na perna do vento, informamos a torre e ela autorizou base quando pronto. Esperamos até chegar o momento para girar e viemos para um pouso tranquilo. No final, um pouso praticamente manteiga, muito elogiado pelo Abílio. Livramos na C e E e fomos direto para o pátio do aeroclube.
Ao final do voo, tudo correu sem problemas, fonia, referências e tudo mais. Finalizada a primeira navegação, já consegui a outra para o dia seguinte. Seria para Presidente Prudente. Mas este voo, eu conto no próximo relato ;)
E esta foi a primeira navegação que fiz. Pensei que fosse mais complicada, mas no final é bem tranquilo. Isso até eu fazer a minha última navegação. Vocês descobrirão nos próximos relatos. Eu até levei a câmera para tirar umas fotos, mas acabei esquecendo dentro da bolsa, porém, nas outras duas que fiz, tirei fotos e postarei aqui junto com os relatos. Fiquem no aguardo ;)
Futuro Piloto
Fábio Miguel
blogfuturospilotos@gmail.com