Saudações Comandos.
Tinha feito bons pousos nos voos anteriores, mas os três dias, previstos para o próximo voo, duraram 33 dias. Junto veio a ansiedade e o medo de perder um pouco a sensibilidade, cometer erros e reprovar na manobra, que já estava fácil.
Era sábado, meu voo estava agendado para as 15h, na época de verão sempre chove. Caso não conseguisse voar nesse dia, teria que esperar mais uma semana.
Consultei o código TAF: Probabilidade de 30% de chuva, vento forte e o teto mínimo para condições visuais.
Fui meio desacreditado, mas com aquela esperança de conseguir voar. Quando cheguei ao aeroclube, com uma rápida observação, percebi que a situação estava adversa. Deixei meu nome na lista de encaixe e fiquei na expectativa.
Vários alunos tendo que abortar a missão porque as áreas de treinamento estavam fechadas, mediante algumas formações. Com isso a probabilidade de conseguir um encaixe aumentava. Somente o circuito estava liberado.
Às 11h, consegui um encaixe, chegou o grande dia. Fomos ao briefing, conversa rápida:
-Já sabe tudo o que fazer, tem dúvidas?
-Não, só a prática mesmo. Respondi.
-Então vamos voar. Se começar a chover, vamos ter abortar o voo. Você tem duvidas para preencher uma notificação?
-Nenhuma.
-Para agilizar, você vai inspecionando e eu vou notificar, com isso ganhamos alguns minutos para tentar completar uma hora cheia.
O avião tinha acabado de chegar e estava com o motor quente. Comecei a fazer a inspeção, abrir a tampa do motor, verifiquei se não tinha nenhum objeto obstruindo algo. Me aproximei do berço do motor e chegou o momento de olhar o nível de óleo. Coloquei a mão na tampa, estava fervendo. Peguei uma estopa coloquei na tampa para abri-la sem queimar a mão, mas consegui desrosquear. Normalmente passamos o dedo para limpar a haste, mas naquele caso se tornou desnecessário.
Nível de óleo correto, fui rosquear a tampa. Quando terminei de rosquear, a estopa cai próximo ao berço do motor. Com todo cuidado, fui retirá-la, mas na hora que eu consegui pegar a estopa, acabei encostando no escapamento e me queimei. No reflexo, puxei a mão rápido, e tinha a ponta de um ferro. Rasguei a mão de uma ponta a outra. Quase chorei.
Quando terminei a inspeção, o instrutor já estava voltando da notificação. Acionei a aeronave e iniciamos o táxi, quando deu para perceber que todos tiveram a ideia de adiantar o voo para antecipar a chuva. Tinha bastante tráfego naquele horário, cinco ao todo e todas no circuito.
Ventando bastante naquele dia, mas com o vento alinhado, fiz toda a corrida sem problemas, tirei do chão, 2200rpm/65mph e a razão de subida estava muito alta, após a decolagem em questão de pouco tempo já fazia o cheque de 500’ e estava rodando través a 1000’.
Mantive todo o circuito, rodei base e final, era só fazer tudo aquilo que eu já sabia e tinha feito nas ultimas 12h. Interessante que tinha um CAP-4 na minha frente, com um aluno começando as suas horas de TGL. Como estava logo atrás, enxergava o pouso dele, com isso lembrava-me dos meus erros e já me planejava. Quebrei o planeio e fui arredondando até o toque, houve uma entrada de roda bem leve que só colei o manche o avião ficou no solo. Controlei e arremeti.
Fiz novamente o circuito, tendo que alongar o eixo da pista, rodei través e perna do vento, o instrutor me pede para olhar para Extrema (MG), chovendo muito naquela cidade, mantive o circuito, então começa a chover em Joanópolis (SP).
(Foto: Gustavo Fujiki)
Piracaia (SP) estava horrível e Atibaia (SP) era a pior de todas, não se enxergava a cidade, era um paredão incrível. A visão era linda (só visão), mas em Bragança parecia que existia um buraco. Enquanto não chovia, eu continuava fazendo a manobra.
Trouxe para mais um pouso, sem pressa de colocar o avião no chão, arredondei, toquei três pontos, controlei no solo e arremeti. Toda vez que rodava perna do vento, me deparava com aquele paredão, só torcia para que o vento não o empurrasse na minha direção.
Por causa de outras aeronaves no circuito, tinha que alongar a perna do vento e me aproximava bastante na chuva, rodava base e final, trazia aeronave, quando cruzava a cabeceira, quebrava o planeio, e vinha arredondando. Olhava para o lado, para ter o ‘feeling’, arredondava até colar o manche, tocava três pontos. Deu para sentir a partir do terceiro pouso que não perdi a sensibilidade nesse longo período sem voar.
Mantive a mesma postura e continuei fazendo todas as etapas da manobra, fiz o quarto com uma leve entrada de roda. O quinto pouso foi completo. Quando rodei perna, a situação estava critica, o HPA estava ingressando no circuito, voamos paralelamente até decidir quem iria ter prioridade para pouso, cedemos passagem ao HPA, ele desceu uns 300’ e passou perpendicular a nossa aeronave.
Pensei alto, saiu um “Nossa” espontâneo, na mesma hora ouvi a resposta: “Bonito demais”.
Realmente compartilhamos da mesma paixão.
Com isso, tive que alongar a perna do vento. Passei bem próximo da chuva que chegou a molhar o um pouco o para-brisa, rodei base e final, só tinha que consumar a manobra. Quebrei o planeio sem pressa, fui arredondando, até colar o manche. Toquei e fiquei, livrei a pista na intersecção da biruta.
O instrutor bate no meu ombro e pergunta:
-Eai, acha que está aprovado?
-Não sei, o instrutor que tem que avaliar, se você falar que sim. respondi
-Vamos dar continuidade do curso, está aprovado.
O Paulistinha é em tandem, porque se não fosse, ele ia me ver com um sorriso maior que o corte na mão, de uma ponta a outra do rosto.
Taxiei até o pátio, cortei o motor, fiz o cheque de abandono e já guardamos a aeronave no hangar, fomos ao debriefing:
– Parabéns, você foi aprovado na manobra, agora é estudar a próxima que é AP01, 360º na Vertical.
Depois de 15 voos, 13.3h, 63 pousos e R$ 3.910 menos rico, fui aprovado na manobra.
Semana que vem tem mais.
Boa semana e bons voos.
Rafael Torquato