Pela lógica, eu deveria usar nesse artigo explicações envolvendo aerodinâmica e teoria de voo, mostrando como funciona o deslocamento da camada limite no estol comandado, ou mesmo como o ar perpendicular torna os comandos inúteis, para assim percebermos a forma de evitá-lo em qualquer atitude do voo. Mas isso seria de muito pouca utilidade a vocês. Existe, no entanto, uma forma de evitar o parafuso, hoje apontada por dezenas de pesquisas nacionais. É o famoso CRM (Corporate Resource Management). Mas por que CRM?
Simples: o CRM foi criado com o objetivo de promover o uso eficaz de todos os recursos disponíveis. No contexto da aviação, aplica-se para obter segurança e eficiência nas operações aéreas. Aplicando o CRM no nosso caso, obteríamos uma melhor avaliação das informações nos instrumentos principais, um redução das ações em casos de emergência às ações essenciais, com foco no que é realmente importante para somente um piloto a bordo. Deste modo, teríamos claramente uma maior eficiência das informações presentes no painel, ainda que você esteja voando Paulistinha somente com velocímetro e climb.
Um estudo realizado em 1979 revelou que os tripulantes que utilizavam o CRM conseguiam obter um desempenho muito melhor, e evitavam falhas humanas sérias, bem como melhoravam o processo decisório na cabine. Qualquer semelhança com o nosso caso não é mera coincidência. Uma aeronave jamais entrará em um stol e parafuso sem que a mesma seja forçada de alguma forma a isso. Esse esforço pode ser voluntário, através de manobras, ou involuntário, através de erros dos pilotos em procedimentos, acionamento de dispositivos em momentos inoportunos, e até da não observação de alertas na cabine.
É aí que entra não o conhecimento impecável de teoria do voo, mas sim a eficácia na leitura e gerenciamento de informações na cabine. Se você, como citei, tiver apenas um velocímetro e climb, é possível achar o melhor meio para utilizá-los, a fim de evitar que sua aeronave passe dos seus limites. Já se você dispõe de um painel completo para tal, é o caso de saber administrar e filtrar as informações realmente necessárias.
Se pudesse dar, genericamente, quatro dicas utilizáveis de fato, seriam:
1. Nunca explore o envelope da sua aeronave em baixas altitudes;
2. Nunca faça curvas além de 30 graus no circuito de tráfego, os puxões de orelha do instrutor têm sentido;
3. Não siga outra aeronave no circuito muito de perto. Se ela estiver muito lenta, você vai precisar talvez forçar a sua a voar devagar demais;
4. E para terminar: jamais abuse e queira se mostrar com sua aeronave, você não precisa disso.
Como eu disse num artigo anterior, cerca de 35% dos casos de acidentes aéreos no Brasil devem-se ao “jeitinho brasileiro” de levar as coisas. Leia-se “jeitinho” por diferentes formas de se violar as regras aeronáuticas. A regra geral é ser consciente dos seus limites, e saber que, se você não atrapalhar, a aeronave voa sozinha.
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