Não leve sua ‘’casa’’ para o seu cockpit

Existem diversos e filmes de aviação que mostram casos de pilotos e tripulação que tinham problemas em casa, ou no seu convívio social, e os acabaram levando para dentro do cockpit. Dessa forma, prejudicaram sua performance a bordo e causaram o que em CRM se chama de contaminação. Cria-se assim um clima a bordo que transmite aos demais tripulantes uma sensação de insegurança no que tange a comunicação, fragilizando um elo muito importante da segurança do voo.

Um exemplo de filme que relata isso é o famoso Top Gun, que provavelmente todos nós já assistimos. Apesar do acidente em que o “Maverick” se envolveu ter sido acidental, ele fica totalmente paralisado psicologicamente em função da perda do companheiro. E muito embora o seu corpo exerça a atividade do voo, sua mente está em outro lugar. Isso não é exclusividade do voo militar: infelizmente, é praticamente impossível para um piloto civil deixar em solo tudo que o preocupa, e envolve seu emocional. Seria como colocar um robô na cadeira de comando.

Às vezes, um piloto vai cumprir sua escala de voo já no fim da noite, provavelmente depois de um dia conturbado e cheio de preocupações. Em alguns casos, o piloto estava de sobreaviso, e mal sabia que naquela noite precisaria substituir alguém. Se seu dia foi extremamente problemático, acredite: não será no caminho de casa para o aeroporto que todos os seus problemas vão sumir magicamente. Às vezes, eles só pioram. Mas não podemos nos dar ao luxo de passar nosso estado emocional para o nosso desempenho a bordo. A área em que o piloto atua exige 110% de eficiência, atenção e comunicação a bordo. Então, como manter o padrão?

Infelizmente, diferente dos outros dois fatores – Meio e Máquina- o fator Homem não possui um manual explicativo sobre procedimentos e reações naturais. Isso seria impossível de se criar. Quando muito, temos restrições legais sobre a operação de uma aeronave. Então, você mesmo precisa discernir sobre seu comportamento a bordo, e saber quando não estiver realmente bem para executar uma tarefa. Ninguém está bem todos os dias.

Sigamos supondo que um determinado piloto passe por problemas emocionais e psicológicos, no entanto persista em cumprir sua escala de trabalho. Ele acaba levando para dentro do cockpit sua fadigas pessoais, e em cada fase do voo, desde a decolagem até um pouso tranquilo, vai ter determinados problemas ligados à sua concentração, sua atenção, e também à comunicação a bordo. Uma pesquisa comparativa mostra que 66% de todo o stress e tensão durante o voo está localizado somente na decolagem. Some-se toda a carga usual de tensão nessa fase do voo com um desconforto emocional do piloto, e sem dúvida o psicológico prejudicará de alguma forma o senso de julgamento e percepção do profissional, algo que jamais pode acontecer.

Nos próximos capítulos da série, vamos perceber como esse determinado piloto, nessa situação, vai lidar com cada etapa do voo. Veremos também os riscos envolvidos, desde os checks até a configuração da aeronave numa emergência.

Eduardo Mateus Nobrega
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