Por que voar no exterior? – Parte I

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Como já mencionei em outros posts, trabalho como instrutor de voo na EJ em Jundiaí/SP, e tenho visto, já há alguns anos, muitos copilotos de companhias aéreas com o desejo de checar o PLA, buscando uma oportunidade de trabalho no exterior – Oriente Médio, principalmente. Lembremos que não é necessário ser PLA para trabalhar em uma companhia aérea no Brasil, mas esse requisito às vezes é necessário para trabalhar no exterior.

Para escrever esse artigo, fui buscar a opinião de dois copilotos que atualmente estão voando na Qatar, e um comandante da Avianca. Esse tema é muito extenso, e por isso vou dividi-lo em dois artigos. No primeiro, falarei sobre a motivação de voar fora do país, vantagens e adaptação.

Muitos pilotos têm o desejo de voar no exterior para operar aviões maiores (wide bodies) e voar em rotas internacionais, além de melhorar o salário. Hoje a perspectiva em voar aviões de maior porte no Brasil tende a ser demorada, já que as promoções estão paradas ou estagnadas em função da atual situação econômica do Brasil. Outro ponto a se observar, que é uma característica no Brasil, é o fato da aviação aqui ser cíclica, com momentos de muitas contratações e outros de grandes demissões, incentivando muitos pilotos – com experiência em aeronaves Airbus 320 ou Boeing 737  – a decidir voar no exterior.

Alguns comandantes buscam, no objetivo de voar no exterior, encontrar oportunidades em países como a China, que oferece altos salários, podendo chegar a cerca de U$20.000,00 dólares mensais, com contratos de até 5 anos. Isso possibilita que esse profissional tenha a oportunidade de criar uma estabilidade financeira maior. Outro destino muito cogitado é o Oriente Médio, onde o salário é muito próximo ao da China, quando somados diversos benefícios como moradia, transporte, educação para os filhos, etc.

Esses benefícios, para pilotos casados e com filhos, têm grande peso na escolha entre ir para a China ou o Oriente Médio, já que se deve levar em consideração, muito além de apenas o salário e o equipamento a ser voado, a qualidade de vida para a família. Foi pensando nisso que o copiloto da Qatar, Wellington Kamiya, nos relatou o seguinte:

“Os maiores atrativos são o pacote oferecido pela Qatar para os pilotos, que hoje acredito ser um dos melhores entre todas as empresas, e a segurança que minha família hoje tem morando aqui. Podemos sair na rua a qualquer hora do dia ou da noite, sem nos preocuparmos com assaltos ou qualquer outra coisa. Outro fator que também pesou nessa decisão foi poder estar muito mais presente para minha família. Em pouco mais de um ano voando aqui, fiz somente 20 pernoites (antes fazia isso praticamente em um mês), e desses, somente uns 8 que não foram solicitados por mim através do sistema de solicitações de voos e folgas – vale ressaltar que isso voando no A320”.

Sobre a adaptação, ele me disse o seguinte:

“A adaptação está sendo boa. Costumo dizer para meus amigos que fazem a mesma pergunta o seguinte: aqui não é o paraíso, qualquer lugar onde você for morar terá as vantagens e desvantagens, mas para mim e minha família, as vantagens são com certeza muito maiores. Moramos em um condomínio onde moram também muitos outros brasileiros, então temos muitos amigos aqui. Não sei dizer exatamente o número de Brasileiros que voam na Qatar, mas ouvi dizer que já é a maior comunidade entre pilotos da empresa. Em relação à adaptação a empresa também foi tranquila, apenas diferente do que estava acostumado. Quando voava no Brasil já estudava bastante, mas aqui o nível de cobrança é muito maior, sendo necessário realmente estudar muito para manter-se sempre atualizado. Porém, como sempre digo para quem me pergunta, o que é bom pra mim pode não ser bom pra você e vice-versa. Então, acho que vale a pena, para quem realmente estiver interessado, dar uma passada por aqui antes, e de preferência com a esposa, pois como me disseram aqui no primeiro dia, happy wife, happy life.”

Outra característica importante do trabalho fora do Brasil é a exigência das companhias aéreas estrangeiras sobre o piloto, com relação a padronização das manobras. Sobre isso, conversei com João Carlos Medau, comandante da Avianca, que me relatou que “as empresas estrangeiras são muito rígidas com disciplina, FOQA e padronização operacional, enquanto aqui no Brasil, estamos acostumados a trabalhar de uma forma mais descontraída, o que não ocorre lá fora. Então, é preciso muito mais estudo e dedicação para enquadrar-se na política das empresas. Lá também não existe “jeitinho”. Vale o que está escrito e ponto final. Isso, às vezes, é um problema para aqueles que têm um pouco mais de dificuldade de adaptação”.

Portanto, vejo que o desejo e a decisão de voar na China ou no Oriente Médio são motivados por razões além do salário, já que a qualidade de vida que você terá em sua nova casa é algo que deve ser levado em consideração. E pelo que vimos, a exigência das empresas estrangeiras sobre o Piloto é proporcional ao retorno financeiro.

Fico por aqui nesse post. Na próxima semana, vou falar sobre promoção e crescimento profissional, como é o processo seletivo, o que fazer quando voltar para o Brasil, e como uma companhia aérea vê o piloto que vai voar no exterior.

Rodrigo Satoshi
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