Quando tudo ainda pode ficar pior

Partindo do pressuposto que você tenha obtido êxito em trazer sua aeronave de volta ao solo em uma situação de emergência, e dessa forma tenha preservado as vidas a bordo, a emergência não acaba aí, ao contrário do que muito é mostrado. Dependendo do local do pouso, a continuação do episódio requer outras medidas. Essas medidas tomadas pelo piloto e pela tripulação seriam o citado fator “depois”.

O interessante num pouso de emergência é que ele nunca vai ser feito num lugar já conhecido ou estudado, como a pista do aeroporto de onde você decolou. Um piloto jamais vai decolar sabendo que, em caso de pane, vai pousar no meio de uma mata fechada a quilômetros do ponto de ajuda mais próximo. Numa emergência, você perde parte do seu direito de escolha.

Nosso país possui, como sabemos, dimensões continentais e a variabilidade do terreno é muito clara. Em um voo em rota, você pode encontrar desde regiões serranas de difícil acesso, savanas ou descampados até o próprio litoral. Estar preparado para garantir a segurança da tripulação e passageiros, mesmo após o momento em que suas habilidades e formação foram de fato úteis, é essencial. Um claro exemplo disso é quando uma aeronave precisa realizar um pouso forçado em uma auto estrada movimentada. O risco envolvido nisso é igual ou maior do que se você parasse seu carro na estrada, e permanecesse ali esperando que a sorte não permitisse um acidente com outro veículo. Nesse caso, não basta o piloto realizar o pouso mais habilidoso e sair correndo do avião, carregando quem estiver dentro da aeronave mas deixando-a onde pousou. Um acidente muito maior é algo iminente.

Um pouso no mar ou em região coberta por grande flora requer atitudes muito diferentes, e é por isso que defendo uma formação prática de sobrevivência num curso de piloto comercial/privado de um aeroclube ou escola de formação. Como disse antes, esperar pelo pior não é sempre pessimismo. Muitos se inspiram no que vêem na televisão, e decidem por abandonar a aeronave e sair desbravando o terreno. Isso é o maior erro que a tripulação pode cometer após um acidente em local afastado. Nesse caso, ficar perto do avião é o que garantirá a chance de ser encontrado, em função dos transmissores de emergência. Lembre-se também que, para as equipes de busca e salvamento, é muito mais fácil visualizar uma aeronave caída em meio à mata densa do que uma pessoa caminhando por ela. Já se você lograr a sorte de poder se dirigir a um aeroporto mais próximo, o mínimo que o piloto deve fazer é declarar emergência. Após isso, detalhe a emergência com sinceridade e clareza. Toda a ajuda já estará a caminho antes de você terminar a transmissão.

Perceba que o saber cair com uma aeronave não começa apenas na hora da pane. Certamente, um piloto que saiba cair conhece muito bem sua aeronave, o meio onde voa e os procedimentos durante e após uma emergência. Quando um piloto alcança essas características, ele não se torna pessimista ou predisposto ao pior, mas sim muito mais preparado e profissional, sem o menor interesse em pagar o alto preço de uma experiência ruim.

Eduardo Mateus Nobrega
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