Três preocupados no metrô | Minha Proa: 043

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O que é um treinamento difícil? Para esta pergunta cabe a famosa frase: “Depende do referencial”.

Em mais uma manhã fria no estado de São Paulo, eu havia saído de casa às 7 horas da manhã rumo à metrópole da capital, com destino ao Aeroporto Campo de Marte, onde eu fazia meu treinamento prático de Piloto Privado na época.

Na ocasião, eu já havia passado das fases de pré-solo, solo, e aperfeiçoamento. Estando com cerca de 30 horas de experiência prática, eu iria ingressar na próxima e mais temida fase: a de navegação.

Apesar de hoje eu realizar navegações de várias horas com a mesma tranquilidade de quem vai até a padaria da esquina, na época em questão alguns fatores me davam certo receio e nervosismo.

O primeiro deles era o fato de que, pela primeira vez, eu sairia da minha zona de conforto, a Terminal São Paulo, indo como um novato para a área da Terminal da Academia da Força Aérea, no interior no estado. Como diz a citação, “Temos medo de tudo aquilo que não conhecemos”.

Somado a isso, havia o fato de que já haviam me confirmado o instrutor para aquele voo, e era nada mais nada menos do que o instrutor de voo mais exigente do aeroclube, com o qual eu já havia voado outras duas vezes, e sabia que ele fazia justiça à fama que tinha. Ele não era mal educado, era apenas exigente… Muito exigente. E não media puxões de orelha ou frases de ordem, como “Mais agilidade!”.

Tendo livrado o litoral de São Paulo, eu estava agora no metrô, seguindo para a estação da qual eu seguiria a pé até o aeroporto. Durante a viagem de 30 minutos sobre os trilhos, seguia refletindo e repassando os conceitos da missão que iria voar dentro de algumas horas.

No meio da viagem, as portas se abrem em uma estação, e dois jovens praticamente de minha idade entram, sentando em dois assentos vazios logo ao meu lado.

Eles começam a conversar em um tom de preocupação, o que inevitavelmente logo chama minha atenção. Sem saber ainda ao que se referem, eles começam a descrever um treinamento prático, com o qual estão preocupados, dando a entender que se aproximam de uma fase crítica dessa avaliação. Por motivos claros acabo me identificando com aquela situação, e começo a me perguntar se eles também eram alunos do mesmo curso que eu, e que talvez estivéssemos indo para o mesmo destino.

A minha estação se mostra como sendo a próxima, e eu me preparo para me levantar, me perguntando ao mesmo tempo se aqueles dois jovens iriam fazer o mesmo, provando minha teoria. Entretanto, os dois se mantém nos lugares.

Estando em pé diante da porta, ainda estava ao alcance deles, que ainda conversavam sobre o mesmo assunto. A estação chega, as portas se abrem, e ao dar o primeiro passo eu escuto um deles dizer:

– “É ‘véi’, essa aula de baliza vai ser tensa”.

No final, tudo depende de seu referencial.

Alexandre Sales
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