Vencendo Receios, de Volta aos Céus

De volta aos céus

A torre autorizou a nossa decolagem, alertando sobre o vento que, naquele momento, soprava de través. Com a manete de potência totalmente à frente, o pequeno Cessna 152 começou a ganhar a pista. Quanto mais velocidade ele desenvolvia, mais sutis precisavam ser os comandos nos pedais, a fim de mantê-lo na centerline – um comando um pouco mais brusco, e logo viria aquela sensação de risco de capotamento lateral. Aos 55 nós, aliviar a pressão à frente no manche mostrou que o avião queria voar, como sempre foi o seu instinto. Bastou uma leve puxada no manche para que ele realizasse o seu desejo.

O vento logo nos jogou de lado, fazendo-me perder o eixo de decolagem – meu erro mais recorrente nesta fase do meu aprendizado. O avião encarou o vento, chegando a subir de lado em alguns momentos. As correntes térmicas ascendentes, próximas à cabeceira oposta, causaram mais alguns solavancos. Na perna do través, o vento fez o avião erguer o nariz. Velocidade indicada e climb dispararam. Senti que não estava conseguindo trazer o avião para os parâmetros desejados, enquanto me assustava com aquela atitude cabrada que, ao menos a mim, lembrava o lançamento do ônibus espacial. “E se excedermos o ângulo crítico? Mas isso seria um problema, com uma velocidade tão alta? Por outro lado, e se entrarmos no arco amarelo?”. A expressão tranquila do instrutor ao meu lado, quase distraído com a paisagem e o circuito de tráfego, deu-me a segurança de que talvez tudo não estivesse tão fora de controle assim. Mantive a calma, e fiquei pensando se eu ficaria tão tranquilo quanto estava, caso ele não estivesse ali.

Já no corredor visual rumo à área de instrução, o valente Cessninha enfrentava as correntes advectivas com a bravura de um barquinho que encara o mar revolto. Era jogado pra cima, pra baixo, para os lados, mas não se dava por vencido, por mais que vez ou outra parecesse estar prestes a perder aquela luta. Um cenário muito diferente do outro voo nas primeiras horas daquele mesmo dia, tranquilo ao ponto de me permitir apreciar a paisagem em alguns instantes, e até soltar os comandos para ver os ponteiros permanecerem imóveis. Já no regresso ao aeroporto, novamente as correntes térmicas ascendentes testaram minha atenção. Ao curvar para a perna base, uma delas jogou o avião numa curva de grande inclinação. Com um frio na barriga, rapidamente tirei o avião daquela atitude que entendo ser perigosa. Na aproximação final, a luta foi para manter as asas niveladas. Ainda que um pouco fora do eixo, tocamos o solo com suavidade. Cumprimos mais uma missão de uma tarde quente de verão.

A verdade é que, talvez, o voo não tenha sido assim tão assustador quanto lhes descrevi. Ao menos, assim ele me pareceu por eu ter ficado tanto tempo sem voar, e por fazer minhas aulas tão espaçadas uma da outra. Hoje entendo a importância de voar com frequência, e recomendo-a a quem esteja aprendendo a voar. Mas se você também enfrenta essa percepção exagerada de riscos, saiba que você não está sozinho. Através dos instrutores, eu soube que mais alunos do que imaginamos enfrentam esses mesmos receios, em nome do seu amor por voar. Cedo ou tarde, certamente nossa confiança se tornará maior do que esses receios, e nos restará apenas cuidar para que ela não seja maior do que deve ser. Até lá, tenhamos a tranquilidade de saber que cada piloto conquista sua auto-confiança a seu próprio tempo, e que as escolas de aviação estão cada vez mais conscientes disso.

Luiz Cláudio Ribeirinho
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