American Airlines – Decolagem autorizada

posted in: Antonio Ribeiro, Textos | 0
A novela American Airlines não é novidade para ninguém que não seja desinformado. Leia qualquer jornal para ver que a empresa anda mal das pernas, e que a situação pode fugir literalmente do controle.
 
A companhia da águia não anda muito bem. Em um espaço de quase sete meses, anunciou a maior encomenda da história mundial, comprometendo-se a comprar no mínimo 460 Boeing 737Max e Airbus A320NEO. Passados quase cinco meses, a companhia anunciou ter em caixa US$ 4,1 bilhões, valor que poderia ser usado “sem restrições”. Mas o buraco é mais embaixo do que se imagina.
 
Surgiram também anúncios informando que “negociações com sindicatos serão feitas, para evitar futuras ações judiciais” e que “o pedido de concordata não afetará as operações fora da terra do Tio Sam”.
 
Com algumas informações confirmadas pelo próprio BNDES, a companhia está tentando renegociando a dívida que tem com este banco, relativo às aeronaves que comprou para sua subsidiária, a American Eagle.
 
Essa agonia mostra como é difícil o mundo da Aviação, e que ele é mais sensível que os outros “mundos”. E que até as “grandes” estão sujeitas a todo tipo de problema ou ajuda.
 
Conforme eu disse no artigo sobre a fusão da TAM e da LAN, juntar os trapos está virando moda, tanto na Aviação como em outros setores. É difícil ver alguma empresa que cresceu sem se unir com a concorrente. Claro que existem exceções, tipo a Azul. Mas ela saiu de alguém que conhecia o setor como a palma de sua própria mão, sendo esse alguém David Neeleman.
 
Infelizmente, ou felizmente, os preços baixaram, mas o nível do serviço também. Se eu for voar numa companhia “tradicional e antiga”, como a TAM, ou numa companhia “moderninha e arrojada”, como a GOL, de São Paulo a Fortaleza, por exemplo, o tempo de vôo seria praticamente o mesmo. O que muda é o valor e o serviço. Enquanto que na GOL o passageiro recebe uma barrinha de cereal e um copinho de refrigerante, a TAM serve um sanduíche e dois copinhos de refrigerante, mas junto com a Gol, costuma manter o padrão de lata de sardinha, e eventualmente, um preço muito parecido. Às vezes, existe uma diferença gritante de um dia para o outro em relação ao preço.
 
O mundo não é o mesmo desde o fim da Guerra Fria. Muitas companhias que eram consideradas “únicas” possuíam seu espaço, mas que não souberam (ou não queriam) ganhar dinheiro. Veja a Varig, a PanAm, a Eastern, a Canadian. Todas eram “imortais”, pois voavam do lado do Poder, que na maioria das vezes criava leis que tinham como objetivo final beneficiar uma companhia em questão. Como disse o Comandante Mesquita (fundador da META Linhas Aéreas, recentemente falecida): “Até hoje, as leis só funcionam para as companhias grandes”. Mas não estamos falando de uma companhia brasileira, então vamos pular essa parte.
 
A Aviação é um negócio de alto risco. Se subir apenas cinqüenta centavos o preço do querosene, por exemplo, já se tem prejuízo para a companhia. E enquanto o executivo tenta raciocinar para descobrir como apagar esse valor negativo, ele perde dinheiro. Talvez seja por isso que o Sales diz “mais agilidade”…
 
A American é uma incógnita. O mesmo que a Varig fez na década de 90 ela fez em um espaço de três anos atrás. Tentou se fundir com a Ibéria e com a British Airways, junto com uma provável aquisição da Japan Airlines, mas escolheu uma péssima época, justamente quando o barril de petróleo passou dos US$100 dólares.
 
Problemas para serem resolvidos não faltam. Pense numa frota diversificada e envelhecida, cada vez mais difícil de manter. O anúncio que a companhia irá tirar 12 757 de circulação ajudará nos custos e na taxa de ocupação. Lembrando que o petróleo está com o preço nas alturas.
 
Agora, vamos passar para um momento “histórico”. Poucos se lembram, mas em 2003 a companhia esteve à beira do Chapter 11, equivalente a nossa “Recuperação Judicial. Fez acordos com tripulantes e funcionários, dando um “jeitinho brasileiro” e escapou da concordata. Mas a Crise bateu a porta da companhia, que até pouco tempo atrás se gabava de ser a única companhia americana que não entrou em concordata.
 
O mercado surpreende e é surpreendido. Alguns dias atrás, a Delta Airlines afirmou estar interessada em comprar a companhia, assumindo suas dívidas. Essa provável aquisição teria efeitos colaterais enormes, criando a maior companhia aérea do mundo. Se essa crise continuar, provavelmente todas as empresas irão entrar em crise se não souberem se reinventar. É necessário elas aprenderem que já acabou aquele luxo de voar, e que não há mais espaço para aqueles cabides de empregos, com quatro classes de serviços.
 
Para meu azar, infelizmente não me pagam nenhum centavo para elogiar a Southwest Airlines ou a JetBlue, muito menos a Delta Airlines ou a United/Continental. Nem mesmo com uma barrinha de cereal e um copo de refrigerante para eu tirar a barriga da miséria (seria muito bom que me pagassem com horas de vôo para PP…). Mas a diferença é que essas companhias são rentáveis, e querem ganhar dinheiro.
 
Caro leitor, o exemplo a seguir não tem nada a ver com Aviação, mas vale para o caso da AA. Se eu fosse proprietário de um bar, eu venderia produtos da Coca Cola (lembre-se que não estou fazendo nenhum merchandising, cito apenas porque sei que vende igual pão quente), por exemplo. Mas se eu vendesse com um preço menor do que eu comprei, eu vou à falência, pois eu não gero lucro, que é necessário para pagar a conta de água, a de luz, comprar equipamentos ou mesmo pagar o meu salário e o de meus funcionários. Para eu conseguir isso, eu precisaria vender o produto a um preço maior, me sujeitando a concorrência. Mas se eu vendesse o produto a um valor acima da concorrência, eu não venderia praticamente nada. Se eu não tivesse sucesso, eu fecharia as portas, provavelmente com um prejuízo enorme. Por isso que companhias “imortais” fecham, pois não souberam se reinventar e se modernizar.
 
Pense nas Southwests e JetBlues da vida. Voando cada parafuso, cada gota de Jet A1, literalmente fazendo das tripas o coração, conquistam seu espaço. Fazendo as contas, descobriram que não precisavam encarecer suas passagens, desde que os vôos saíssem com uma ocupação acima de 70% e que os serviços fossem bem simples. Cobrando por exemplo US$ 69,00 por trecho, a Southwest descobriu que dava para pagar todas as contas, os acionistas, empregados e ainda encontrar um dinheirinho no caixa. Deu no que deu, e hoje, essas duas empresas são gigantes do setor.
 
A American possui tudo para ser uma grande e rentável companhia. Basta um pouquinho de esforço e uma ajudinha de seus colaboradores para as coisas melhorarem. Tradição não é suficiente na Aviação, pois se fosse assim, nenhuma empresa “tradicional” teria falido. Mesmo sendo ineficientes e caras, as companhias que fecharam fazem muita falta, sem nenhuma distinção. Mas se não fizer nada para mudar a situação, vai ter um lugarzinho na Eternidade, ao lado da PanAm e da Eastern. Tomara que o mercado diga depois de um tempo para a companhia “American Airlines, decolagem autorizada”. Mas só o futuro irá dizer. Bons vôos e boa imaginação nas especulações sobre o futuro da companhia e do próprio mercado.
 
Alexandre Sales
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