Mayday Mayday Mayday – Iluminem a pista!

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Noite do dia 08 de julho de 1961. De repente uma voz estranha entra na freqüência da radio Teófilo Otoni, e, um tanto tensa, pergunta: – Isto é Teófilo Otoni? É a cidade de Teófilo Otoni? Da radio local alguém responde: – Sim é Teófilo Otoni, quem é você? Identifique-se, câmbio! A estranha voz retorna e diz: Meu nome é Dionê Lacerda, sou piloto da aeronave que sobrevoa Teófilo Otoni, estou com procedência de Governador Valadares (SNGV), não vejo o aeródromo, preciso pousar. Ajudem-me, ilumine a pista, por favor, câmbio! Após este breve contato entre “terra e ar”, iniciou-se naquela noite uma operação rápida e precisa no sentido de trazer a aeronave e seu piloto, sãos e salvos, a pista do aeroporto da Pampulhinha, no bairro São Jacinto.

Naquele dia, mais precisamente no finalzinho da tarde, quase escurecendo, eu e mais três amigos descíamos o morro do “Pela Jegue”, na época (Morro do Eucalipto atualmente), de onde retornávamos de uma caçada, pois ali no morro havia mato fechado e muitos pés de eucalipto,onde usávamos estilingues e espingardas de ar comprimido (artigo de luxo na época) para matar passarinhos… Notamos que a noite chegava de vez; tudo às escuras por ali.

Lá do alto podiam-se ver algumas localidades a distancia, que nos brindavam com um belo espetáculo de luzes e cores. Rapidamente iniciamos a descida, porém um acontecimento inusitado nos deteve: ao olharmos em direção ao bairro Palmeiras, vimos duas luzes, uma vermelha e uma verde, afastadas uma da outra, entre elas uma luz amarelada se destacava com maior intensidade; uma espécie de farol, vinha em nossa direção em linha reta, se deslocava no ar rapidamente, ao se aproximar do antigo orfanato, notamos que se tratava de um avião, um barulho forte do motor, observamos que era um Cessna. Levou 10 segundos do orfanato ao morro do eucalipto, onde estávamos, passou raspando a copa das arvores, foi tão próximo que sentimos o forte vento e as arvores agitadas devido o deslocamento de ar.

Ficamos paralisados com o que vimos e começamos fazer perguntas a nós mesmos: – avião essa hora? Aqui!!! Como? Por quê? Eu heim…

E assim vimos aquele avião sobrevoar os bairros, em síntese, a aeronave voava em círculos, e notávamos que ao se aproximar do bairro São Jacinto, diminuía a sua velocidade, deixando claro que aquele piloto não estava de tudo perdido, apenas precisava de um ponto de referencia em terra para pousar, mas ele não encontrava, devido a escuridão naquela noite, motivo pelo qual ainda voava em circulo. Ele mudou a trajetória e passou a voar pelo centro da cidade.
Estávamos sem saber o que acontecia com aqueles voos circulares que nos esquecemos de olhar para rua onde morávamos, logo abaixo, vimos todos os moradores no meio da rua olhando para o alto e acompanhando a passagem da aeronave. À medida que íamos descendo o morro, ouvíamos o zum-zum-zum das pessoas que teciam comentários sobre o avião supostamente perdido e ao chegarmos na rua onde morávamos (Santa Izabel), notamos que vários aparelhos de radio estavam sintonizados na emissora local (ZYX7 Radio Teófilo Otoni) que logo após o contato com o piloto do avião, e ser notificada da gravidade e alto risco que envolvia aquele vôo, a radio contatada pelo próprio piloto, conclamava aos motoristas de táxi e particulares que se dirigissem ao aeroporto do São Jacinto, a fim de iluminarem a pista com os faróis para que a aeronave pudesse pousar. E o piloto, na sua orientação, frisava constantemente um detalhe: avisem aos motoristas que, ao se posicionarem ali, o façam no sentido transversal, e liguem somente os faroletes, única e exclusivamente os faroletes, não liguem os faróis altos em hipótese alguma, pois eles poderão me ofuscar a visão ao me aproximar para pouso. E para tranqüilizar as pessoas presentes ali próximos à pista, e que quando estivesse tudo pronto, ele iria realizar os procedimentos de aproximação e desligaria o motor a uns 300 metros da cabeceira da pista para que a hélice parasse de girar e evitar em qualquer possibilidade acidente durante o pouso. Com esta declaração, o piloto deixou claro que não era um aeronauta de primeira viagem e que nunca esteve perdido, teve duvida, sim, na chegada à cidade devido à péssima iluminação na época. Ele tinha total controle da situação, sabendo que iria enfrentar um pouso de alto risco. Os tanques de combustível dos automóveis estavam próximos as duas laterais da pista, um simples deslize, ao pousar ocasionava uma colisão. O piloto pensou em como evitar tudo isso antes do pouso.

Pois bem, ao chegar em casa encontrei meu pai e minha mãe acompanhando o contato da aeronave com a radio. Então o locutor disse: – Oh comandante, você está me ouvindo? Câmbio! E o piloto respondeu:- alto e claro, prossiga, câmbio! O locutor disse em seguida:- comandante recebemos a informação que está tudo pronto no São Jacinto, o contingente de pessoas já foi evacuado para área segura, os automóveis estão posicionados, a uma ambulância com uma equipe media e enfermeiros preparados para qualquer emergência, tudo conforme a sua orientação. Confirme comandante: – Recebi alto e claro, diz o piloto Dionê.

-Agora preciso buscar posicionamento para a aproximação com a pista, peço orientação para a aproximação com a pista. Falou Dionê

Em terra a resposta imediata: – Comandante é o seguinte, neste momento você sobrevoa o centro da cidade com proa norte, em seguida estará sobrevoando a Vila São João e virando a esquerda, sobrevoará a Turma 37, na altitude que se encontra olhando a sua esquerda, verá um grande clarão no solo, é ali a pista. Confirme câmbio!

O piloto responde:- Confirmado, acabo de sobrevoar a Vila São João e estou chegando sobre a Turma 37 e já avisto a iluminação aos 5 km, termino de fazer a aproximação!

Em terra: – Positivo comandante, agora sim, é com você. Antes, porém nós aqui da Radio e toda a população de Teófilo Otoni está com você nesse pouso, boa sorte! A pista é toda sua…

O piloto responde rapidamente: – Eu agradeço de coração a todos vocês, término de fazer a aproximação, a pista já está à frente, falo com você em breve! Câmbio desliga.

Após dizer isso, fez um silêncio sepulcral na cidade, até mesmo a Radio Teófilo Otoni silenciou-se por alguns segundos; o avião ia pousar, a apreensão era grande, o que será que aconteceu? O próprio locutor retornava em voz baixa, com ares de preocupação, dizendo: – Estamos aguardando contato com o bairro São Jacinto, nosso repórter está próximo a pista, esperamos que tenha dado tudo certo. De repente, aquela explosão de euforia invade os transmissores da Rádio Teófilo Otoni: Viva! Viva! Um clima de comemoração contagiante tomava conta das pessoas ali presentes, e o repórter entra em ação lá do aeroporto e diz: – Atenção, atenção, equipe técnica! Atenção ouvintes! A aeronave pousou suavemente, sem problemas, neste momento está taxiando na pista, buscando chegar ao hangar principal do aeroporto; em seguida, tentaremos fazer o primeiro contato em primeira mão com o piloto Dionê Lainer Lacerda que também proprietário do Táxi Aéreo Teófilo Otoni, que ira falar sobre os acontecimentos que o envolveram essa noite. Está difícil, as pessoas se aglomeram, todos querem ver o piloto da aeronave de perto, mas estão sendo contidas pelos policiais militares que aqui se encontram, isso porque o avião  de modelo CESSNA com o prefixo PT-BCK está com o motor ligado, e é terminantemente proibido se aproximar da aeronave devido ao risco de vida. O repórter continuou trabalhando ali, mas o que interessava mesmo era o depoimento do piloto sobre o ocorrido e os motivos que fizera tudo aquilo acontecesse.

O aeroporto estava parecendo Sucupira de Odorico Paraguassu, com todo respeito a obra de Dias Gomes.

Pois bem, Dionê contou o que aconteceu de errado. Naquele dia tinha um voo de Teófilo Otoni (SNTO) a Governador Valadares (SNGV), isto seria feito em tempo hábil, para que fosse à SNGV e retornasse à SNTO antes do por do sol, porém houve um imprevisto atrasando a partida para SNGV e que voltaria para SNTO às escuras, como o aeródromo de Teófilo Otoni ainda não tinha iluminação, então pediu para que o seu funcionário e disse: – Vou até Valadares; quando voltar, já vai estar escuro, portanto pegue os galões de tinta vazios e  encha-os com óleo queimado e coloque estopa em todas eles até encharcar, coloque-os nas laterais da pista. Então assim que escurecer você coloca fogo nas estopas que  vão demorar cerca de 3 horas para queimar, tenho certeza que com esse balizamento pousarei sem problemas .

O funcionário falou que poderia ir sossegado que iria realizar todos os procedimentos.

O funcionário ao invés de por óleo queimado, colocou gasolina nos galões e essa composição queima excessivamente rápido e não agüenta se quer 30min .

Assim quando a aeronave retornou já havia queimado todo o combustível, estavam apagadas, e o funcionário tão logo acendeu as tochas e foi embora e não viu a besteira que fez. Mas felizmente tudo acabou bem.

Dois dias depois o piloto Dionê Lacerda foi à redação do jornal “O Liberal”  e publicou uma nota de agradecimento ao povo de Teófilo Otoni.

Dionê Laigner Lacerda, proprietário e piloto do Táxi Aéreo Teófilo Otoni, agradece sensibilizado a colaboração que lhe deu a população e principalmente os motoristas, e ainda as orações pedindo por sua sorte, na noite do dia 08 de julho de 1961, quando, em virtude do mau tempo em sua rota para Governador Valadares para Teófilo Otoni, aqui chegou já a noite.

Provas de solidariedade humana como esta dizem bem alto do coração generoso da boa gente desta terra, a quem fico devendo a possibilidade de ter aterrissado com segurança. Deus a todos recompense.

Teófilo Otoni, 10 de julho de 1961

Dionê Laigner Lacerda.

Autor deste texo: José Alfredo Petzold Brandão
Adaptado por Natanael Mariano Souza Neto (estudante de PU em Teófilo Otoni-MG)

Alexandre Sales
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