Respondendo os leitores

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Coluna de Coaching de Formação Aeronáutica – Raul Marinho / Blog Canal Piloto
Tema da semana: Respondendo aos leitores
 
Caros leitores do Canal Piloto, Oscar Lima Alpha!
 
Na semana passada, eu falei que poderíamos tratar de um assunto novo nesta semana – havia selecionado o tema “penduricalhos de currículo” (ICAO test, Jet Trainer, PLA teórico), inclusive – se não houvesse um caso novo a ser destrinchado. Ocorre que houve muitos comentários na última coluna, sobre assuntos que entendo serem muito importantes para merecerem somente um comentário de pé da página. Por isso, vou dedicar a coluna desta semana somente a responder aos leitores, e na semana que vem eu apresentarei o tema novo, ok? Mas para não decepcionar completamente os leitores que estavam esperando informações sobre os tais penduricalhos, eu indico os seguintes posts do meu bloguinho:

– Sobre o ICAO test
 
– Sobre o Jet Trainer
 
– Sobre o PLA teórico
 
Passemos, então, aos comentários dos leitores:
  1. Ainda sobre o assunto faculdade, o Thiago Pecorari comenta sobre a possibilidade de eliminação de matérias para quem já está com o PC checado, o que permitiria concluir o curso superior de Aviação Civil com um ano, somente. Na semana passada, eu já havia recomendado esta estratégia à Bettina, mas agora eu estou achando que este é um caminho interessante para praticamente todo mundo. De fato, é muito mais vantagem checar o PC e depois fazer a faculdade do que trilhar o caminho tradicional, em ordem inversa. Sai muito mais barato, e chega ao mesmo resultado final.
 
  1. Depois veio o outro Thiago, atravessando o samba com essa pergunta nada a ver sobre uso de óculos, num post sobre possibilidades financeiras para pagar horas de voo – já devidamente admoestado, diga-se. A propósito, se alguém quiser fazer um comentário ou perguntar alguma coisa para mim sem relação com o assunto abordado na coluna da semana, eu peço que use este espaço do meu blog – que, como vocês poderão notar, não deixa nenhuma pergunta sem resposta. Na minha resposta ao Thiago atravessador-de-samba, eu disse que fui mal orientado e que tomei decisões erradas anos atrás, e gostaria de explicar melhor o que quis dizer com isso. Nos idos de 1983 (quando a maioria dos leitores daqui nem havia nascido, imagino), eu era um adolescente louco por aviões de caça supersônicos, e tinha o sonho de ser piloto da FAB. Por isso, prestei o exame para a EPCAr (escola de ensino médio da Aeronáutica que dá acesso à Academia da Força Aérea) e passei, faltando somente os exames médico e físico para ser admitido. Ocorre que, no exame oftalmológico, eu fui reprovado por causa de astigmatismo e hipermetropia, com direito a esculhambação total por parte do médico. Na cabeça daquele oftalmologista, eu deveria saber que não poderia entrar na FAB, e estava lá só atrapalhando o processo. Tomei um carimbo de “INAPTO DEFINITIVAMENTE” na ficha e uma lição de moral que, para mim, funcionou como um aviso de que eu jamais poderia sentar num cockpit de avião, mesmo civil, por toda a vida – embora, muito provavelmente, não tenha sido exatamente isso o que o médico falou, mas foi a mensagem que eu entendi na época. Bem, mas o fato é que, por causa disso, eu fiquei 25 anos afastado da aviação, só retomando meu sonho de ser aviador aos 40 anos. Em parte por isso que eu faço esse trabalho de coaching aeronáutico hoje em dia: se tivesse um cara para me orientar corretamente naquela época, pode ser que a história da minha vida fosse completamente diferente. E também por isso que eu sei da responsabilidade que é orientar corretamente as pessoas quanto às particularidades da carreira de aviador. Bem, mas voltando ao trilho, o que quero deixar claro aqui para todos os leitores é que: 1)Prestem atenção ao que está sendo tratado na coluna, e só comentem se houver pertinência com o assunto tratado; e 2)Em havendo dúvidas sobre outros assuntos, não deixem de me contactar, mas pelo caminho correto: a página de perguntas e respostas do meu blog que eu citei logo atrás.
 
  1. Ao Samuel de Brito, que pergunta se alguém tem alguma idéia melhor para lhe ajudar: Eu tenho, sim! Em primeiro lugar, eu acredito que você precisa ter um diálogo mais franco e racional com os seus pais. Não sei se eles são sensatos ou esclarecidos sobre a aviação, mas cabe a você explicar corretamente por que você quer ser piloto, por que você acha que tem condições para tal, etc. Se eles não entenderem, é outro problema, mas pelo menos tente: mostre informações, reportagens, números; demonstre maturidade na sua escolha. Outra questão é a seguinte: você tem somente 17 anos, mas está agindo como se tivesse 47, e tivesse que correr que nem um louco porque seu tempo está acabando. Calma, rapaz: se você tem pressa, faça as coisas com cuidado. Essa história de querer juntar R$3mil para pagar um curso de PP que vai te custar pelo menos R$15mil, por exemplo… Onde isso vai te levar? Você precisa de mais planejamento, menos afobação, e muito, mas muito mais maturidade.
     
    Uma boa ideia para você seria seguir os passos do Athos Gabriel, cuja estratégia eu comento a seguir. Se você cursar a UnB, você dobra a sua capacidade poupadora, para R$1mil/mês, o que significa que, quando você se formar, contando com os juros da poupança, você terá condições de fazer seu PP+PC (mais MLTE, IFR, e todos os penduricalhos possíveis) sem dificuldades. Neste momento, você estará com 23 anos, e com a sua formação universitária, que também lhe franqueará a proficiência linguística ICAO com sobras, a porta da aviação estarão escancaradas para você. Não é espetacular?
 
  1. Ao já citado Athos Gabriel, que resolveu ir pelo caminho da universidade pública, estendo os meus parabéns anteriormente concedidos ao Marlon e ao Guilherme A. Só que, neste caso, o Athos está matando três coelhos com uma cajadada: 1)tendo o tão requisitado nível superior (e de graça), 2)treinando o inglês para o ICAO test, e 3)acrescentando o espanhol e o francês ao currículo, o que pode ser um grande diferencial no futuro. Imagine se pintar uma vaga para pilotar o Citation Ten de um empresário que viaja todo mês para Buenos Aires e Paris, e estejam na disputa o Athos e um outro piloto com curso superior e ICAO-5 (mas sem falar francês e espanhol), quem ficará com a vaga?
     
    Ainda sobre os comentários do Athos, eu gostaria de falar um pouco sobre a palestra que ele assistiu, do ex-morador de cortiço que virou comandante da TAM. Eu conheço várias histórias de superação deste tipo, como é o caso do Cmte. Rolim, que falei no post anterior. Mas o que eu NÃO conheço é alguma história de um único piloto profissional que tenha origem na classe alta. Nenhum caso, nada… Eu até conheço pessoas com a licença de PC que vieram de família rica, mas não se tratam de pilotos que vivam exclusivamente da atividade de pilotar aviões para terceiros, que vivam disso. É um caso para se pensar, não? No futuro, a gente vai voltar a falar deste assunto, e eu vou explicar por que isso acontece. (Nota: por “rico” ou “classe alta”, eu me refiro a abastado mesmo; comandante de linha internacional que ganha R$25mil é classe média alta, no máximo).
 
  1. Ao Yuri, que mostrou as diferenças de valor das mensalidades da PUC-RS e da Anhembi Morumbi, eu dou o braço a torcer. Não sabia que a PUC era tão mais cara assim… Neste caso, vou concordar com você: é melhor ficar em São Paulo mesmo, e “levar um MLTE de brinde”. A propósito, para os caçadores de pechincha, eu fiquei sabendo que o Aeroclube de Sorocaba está com uma promoção de R$180/h para o Paulistinha no pacote. A quem interessar, é uma ótima opção.
 
  1. O Gustavo, que falou sobre os controladores, me lembrou que esta é uma boa alternativa de trabalho para juntar dinheiro para bancar o curso de piloto, além dos comissários e DOVs. Eu conheço dois ex-controladores que se deram muito bem na aviação como pilotos – sem contar que a profissão também abre portas para o ensino em aeroclubes e escolas, seja em matérias teóricas, seja em simulador. É uma estratégia de longo prazo – acho que não seria ético ficar menos de 15-20 anos controlando antes de sair da FAB, pois o investimento no controlador é muito alto –, mas não deixa de ser uma possibilidade.
 
  1. Ao Carlos Junior, eu esclareço que chamo o meu blog “Para ser piloto” de bloguinho porque ele não é um blog de verdade, como o Canal Piloto, com vários posts todos os dias, vídeos, montagens, promoções, etc. Meu blog é um repositório de textos meus e um canal de comunicação com os leitores, não mais que isso. Por isso, bloguinho, sacou? Mas eu tenho muito orgulho do meu blog – pobre, porém limpinho!
 
  1. O Pedro Orsi Vieira fala da possibilidade de fazer vôos panorâmicos para reduzir os custos de formação de PC. Bem, Pedro, este é um assunto complicado… Na verdade, verdade mesmo, interpretando corretamente a fria letra da lei, um aluno de PC, matriculado num curso regular, não poderia realizar vôos com passageiros na sua instrução. Só seria possível esse tipo de voo para quem está fazendo a instrução fora de curso homologado, checando com 200h – e mesmo assim, é uma bola dividida, pois existe remuneração indireta pelo voo (o que é exclusividade de PCs), que é o piloto deixar de pagar por um voo de instrução, mas nem vou entrar nesse mérito.
     
    De qualquer maneira, este não é o único problema desta estratégia de reduzir o custo da instrução com vôos panorâmicos realizados por alunos de PC. Vou tomar como exemplo o que acontece no ASP-Aeroclube de São Paulo, onde este tipo de função é chamada de PA – Piloto de Apoio. No ASP, só pode ser PA quem tiver mais de 100h de voo. Como esse aluno, se quiser checar o PC-IFR com 150h, vai precisar de pelo menos umas 25h de voo duplo-comando de instrução IFR (contando com 25h de simulador AATD e as horas de “excedente IFR” que falei no post da semana passada), somente haveria a possibilidade de fazer 25h como PA. Mas a escala de PA é lotada, e os pilotos mais velhos sempre têm prioridade; na prática, pode-se dizer que feliz do PA novinho que consegue voar 1h/semana. Isso significa que o cara que for por esse caminho vai levar uns 6 meses para fazer essas 25h visuais de graça. Compensa? Talvez, sim, pois é uma boa oportunidade de se enturmar na aviação, uma chance de experimentar o voo com passageiros bem cedo, etc – sei lá, depende de cada um. Mas, se a idéia é economizar prá valer, acho que seria mais vantajoso ter feito todas as horas no Boero (lembre-se que, para ser PA, é preciso ter experiência no Tupi, bem mais caro). Percebe como esse negócio de voo panorâmico não é tão simples como parece?
 
  1. O Yuri retorna aos comentários para perguntar sobre simuladores MNTE, MLTE e LOFT. Eu pretendo tratar exclusivamente de simuladores num post futuro, mas esta é uma boa pergunta, e pertinente ao tópico, pois implica em custos de formação, então vamos lá.
     
    Na minha formação de PC, eu fiz simuladores MNTE/C172-G1000 e MLTE/Seneca na EJ (ambos AATD), e simulador MNTE-Corisco não homologado no Aeroclube de São Paulo (seria um BATD, se fosse homologado). Para quem não conhece do assunto, o simulador AATD tem projeção de cenários, e o BATD somente o painel, mas eu vou explicar isso melhor numa coluna futura. Bem, mas a questão é: onde aprendi mais? Resposta: no ASP, por causa da qualificação dos instrutores. Conclusão: não se deixe impressionar pelo equipamento; para aprender IFR, o que vale mesmo é o instrutor.
     
    Para a instrução IFR em simulador, o que é de “extrema necessidade” (como você colocou) é ter um bom instrutor, mas tem outras coisas que você aprende num simulador além do IFR – todas não essenciais, que fique claro desde o início. Para aprender a lidar com um painel do tipo ”Glass Cockpit” como o Garmin-1000, o que vai importar mesmo é o equipamento, e ter feito o simulador G1000 na EJ foi importante para isso. Também foi legal ter feito o simulador do Seneca antes das horas MLTE: ajudou na instrução multimotor, sem dúvida. Mas tudo isso é perfumaria, nada que você realmente precise fazer antes de checar o PC.
     
    Agora, vamos falar um pouco sobre esse tal de LOFT-Line Oriented Flight Training, um termo que eu nem conhecia e precisei pesquisar – quem quiser entender melhor o assunto, veja isso. Depois que eu li esse paper, eu vi que até já tinha feito um treinamento LOFT no meu Jet Trainer, mas não mencionaram esse termo na ocasião. De qualquer maneira, resumindo, o LOFT é um treinamento de CRM que você faz num simulador que comporta piloto e copiloto, direcionado para a operação em linhas aéreas. Se eu disse que o simulador de G1000 e de MLTE não eram essenciais, o LOFT então, eu diria que nem é recomendável para antes do cheque de PC. Até checar o PC, preocupe-se com o voo IFR, que é difícil, trabalhoso, e leva tempo para aprender – depois você pensa nessas frescuras.
 
  1. O Lieberti pergunta sobre um assunto muito procurado no meu bloguinho, que é a possibilidade de fazer horas de voo para o PC como copiloto em táxi aéreo.
     
    Em primeiro lugar, deixe eu esclarecer uma coisa: para voar em aeronave de táxi aéreo, mesmo como copiloto em treinamento, é preciso ser no mínimo PC, e ter um contrato de trabalho assinado com a empresa. Mas é possível fazer horas de PC voando em aeronaves particulares, sim – desde que estas sejam de propriedade de pessoas físicas, ou de empresas sem o objeto social de transporte aéreo público regular ou não regular. Quer dizer, poder, pode, mas não é muito compensador. Veja por quê:
     
    Como “copiloto” de uma aeronave classe MNTE ou MLTE, na verdade você não é copiloto, pois essas aeronaves não requerem dois pilotos para voar – e se for uma aeronave TIPO que requeira piloto e copiloto (não são todas, só as mais complexas), você precisará de curso e horas de voo específicas, que são caríssimas. Então, tecnicamente falando, você estará voando em duplo-comando, o que significa que somente um dos dois pilotos no cockpit será o piloto em comando do avião – e adivinhe quem é que estará comandando a aeronave? E como você estará voando fora de curso homologado, vai precisar de um mínimo de 100h de voo em comando para checar o seu PC. Assim, ou você convence o comandante de fato de que você deverá comandar o voo (o que é difícil, a menos que ele seja muito seu chapa), ou você precisará pagar 100h de voo em um aeroclube para obter essas horas de voo em comando (o que é caro). Mas as complicações não param por aí.
     
    Chegando o momento do treinamento IFR, aí sim você precisará realizar vôos em duplo-comando. O problema é que, para estes vôos, o comandante do voo deverá ser, obrigatoriamente, INVA ou PLA, e ele vai ter que preencher as fichas de avaliação a cada voo, e fazer uma declaração de instrução no final. Piorou, né? Então, supondo que você checou o seu PP com 40h, que você voou 100h no aeroclube para fazer as horas em comando, e pelo menos mais umas 25h em instrução IFR também no aeroclube, você somou 165h de voo sem poder voar de “copiloto” no avião particular. Agora, pelas 35h restantes, você poderá, enfim, voar em duplo-comando – supostamente, de graça. Vale a pena?
     
    E, finalmente:
     
  1. Ao Felipe L., que tem o pai incentivando a fazer a PUC-RS, eu diria o seguinte: Se você tiver a chance de fazer essa faculdade, não bobeie, faça mesmo; mas se fazer a PUC implicar em comprometer a sua capacidade de pagar as horas de voo, nem comece, e vá pelo caminho “tradicional” mesmo (aeroclube/escola), senão você nem se forma PC, nem consegue se formar. E leia a coluna da semana retrasada, que trata exaustivamente disso.
Bem, pessoal, era isso o que tinha para falar. Até a semana que vem, com a coluna sobre os “penduricalhos”. Aliás, na terça-feira que vem, 01/11, eu irei fazer a prova de inglês ICAO, na Cultura Inglesa, em São Paulo. Vamos fazer aquela “corrente prá frente” para ver se eu consigo pelo menos um ICAO-4!
 
Um abração a todos.
Alexandre Sales
Redes
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