Você ainda trabalha aqui? | Minha Proa: 068

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A escolha de muitos nem sempre reflete a escola de todos.

Se você encontrar uma criança que deseje se tornar piloto, e perguntá-la onde ela deseja trabalhar quando crescer, muito provavelmente esta citará o nome de alguma empresa de linha aérea. Nas reportagens, filmes e viagens, esse é o gênero de aviação com a qual mais temos contanto, e portanto, é aquela através da qual muitos se apaixonam, e onde desejam trabalhar.

Lembrando dos amigos da época do meu curso teórico de PP, lembro que até aquele momento muitos mantinham esse desejo. Se em algum momento o táxi aéreo ou aviação de instrução eram citadas, se tratava apenas de um contexto no qual esse seria o método para ganhar experiência, para em seguida ser habilitado a se candidatar para o cargo de primeiro oficial na linha aérea.

Sim, eu também me incluía naquele raciocínio. Entretanto, era mais por maioria de votos do que por escolha própria. Afinal, havia me apaixonado pela aviação por outra frente.

Quando comecei minhas aulas de voo, no mesmo ritmo que comecei a dominar a aeronave, também comecei a conhecer e gostar desse gênero mais básico da aviação. Juntamente com isso, acabei por ter como ídolos alguns dos instrutores com os quais mais voei. Assim, eu começava a cogitar cada vez mais trabalhar nesse gênero de aviação quando o destino permitisse. Aos poucos a linha aérea passou a ser não um objetivo final, mas sim uma mera possibilidade. Eu gostaria de chegar lá um dia? Claro. Mas me sentiria frustrado se não o fizesse? Jamais.

Com o passar do tempo conheci outros pilotos que acabaram seguindo esse mesmo caminho, seja por planejamento ou acasos do destino. Alguns dos mais experientes instrutores que conheci são os que optaram por fazer carreira nesse segmento, e apesar de nunca terem voado uma aeronave a reação, possuíam mais horas totais que muitos comandantes de linha aérea.

Através de um amigo eu soube de uma história que reflete bem esse cenário.

Anos após se formar, um piloto que já voava na linha aérea como primeiro oficial resolveu utilizar uma de suas folgas para retornar ao local onde aprendeu a voar, a fim de rever as aeronaves e conferir como estava o aeródromo após todo esse tempo.

Quando ingressou viu muitos instrutores novos, alunos desconhecidos, e outras pessoas trabalhando no atendimento. Mas dentre muitos estranhos, um conhecido lhe fez abrir um sorriso. Era um de seus antigos instrutores, que ainda trabalhava no local apesar da grande rotatividade.

O instrutor ainda era jovem, e a essa altura já tinha uma experiência relevante. Então por que ainda estava ali? Ele resolveu perguntar.

– Instrutor fulano, você ainda trabalha aqui? Eu me matriculei, me formei, entrei na linha aérea, e você ainda ficou para trás? – Disse ele em tom de brincadeira.

O instrutor o cumprimenta, abre um sorriso, e diz:

– Caro, e quem falou para você… Que eu quero sair daqui?

Todos riem, felizes em trabalhar naquilo que cada um escolheu.

Alexandre Sales
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