Operações na Prática – Por Philipe Pacheco

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No quarto e último capítulo da série Operações, falemos agora de como todos os profissionais trabalham na prática. Após a descrição da Diretoria de Operações (link), Engenharia de Operações (link) e CCO (link), mostrarei agora como todos os setores e profissionais trabalham de forma integrada para garantir que todos os voos da empresa saiam com tranquilidade, pontualidade e segurança. Usarei exemplos de situações cotidianas para melhor ilustrar como é feita a tomada de decisão e como os setores se organizam no dia a dia.

1. Após o pouso, é constatado vazamento hidráulico por uma linha no trem de pouso.

Logo após o pouso, o Cmte reporta ao mecânico da base que notou queda de pressão e quantidade de fluído num dos sistemas hidráulicos da aeronave. O mecânico da base então constata que há uma grande poça de óleo hidráulico próximo ao trem de pouso da aeronave. Após inspeção superficial, é constatado que se trata de um vazamento grande devido a uma mangueira rompida.

O Cmte então, em contato com o Piloto Coordenador informa sobre o vazamento. O mecânico da base, por sua vez, informa ao Trouble Shooting. Após o mecânico constatar, já instruído pelo Trouble Shooting, através de uma inspeção detalhada seguindo um checklist, que o vazamento está fora dos padrões máximos para liberação, irá checar junto ao estoque de peças da base se há material para substituição. Não havendo peça disponível, é definido entre o mecânico e o Trouble Shooting que a aeronave está na condição AOG (Aircraft On Ground), ou seja, não pode voar enquanto a pane não foi sanada.

O Trouble Shooting, logo após confirmar o AOG informa a coordenação e ao piloto coordenador que o voo não poderá seguir. A coordenação informará imediatamente a escala de voos que a tripulação daquele voo está retida no solo devido impossibilidade do voo seguir.

A coordenação de voos, já analisa se há possibilidade de troca imediata de aeronave e caso não seja possível, todo o trilho previsto para o avião naquele dia é checado para definir quais voos terão atraso. Após análise de todas as informações, os coordenadores efetuam mudanças de trilho entre as demais aeronaves para tentar minimizar ou evitar atrasos de outros voos e define junto a base como irá acomodar os passageiros do voo afetado.

Enquanto o Trouble Shooting define a logística para envio de material para a base, num outro voo da empresa ou num voo de empresa congênere, a escala de voos já efetua a mudança de programação dos tripulantes e informa aos mesmos das mudanças, que poderá ser assumir outro voo, seguir de passageiro num voo da empresa ou congênere para assumir outros voos ou ir ao hotel e aguardar a liberação da aeronave.

2. Aeronave liberada acordo MEL com item restritivo

Logo após o pouso, o Cmte informa que a pressão em um dos dutos pneumáticos da pressurização está muito baixa. O mecânico da base, efetuando inspeção constata que uma das válvulas de sangria de ar de um dos motores da aeronave está danificada, motivo pelo qual não há pressão suficiente no duto. Em contato com o Trouble Shooting, é definido que devido tempo de solo reduzido, não será possível efetuar a troca da válvula na base, porém, por tratar-se de uma falha em que a aeronave pode prosseguir na programação, é feita a liberação MEL.

O Trouble Shooting informa ao piloto coordenador a respeito da liberação e informa a restrição operacional, no caso, proibição de voo em regiões com previsão de formação de gelo e restrição de nível de voo. O piloto coordenador então informa ao DOV que efetuou o despacho do voo, que irá fazer novamente a análise, agora para um nível de voo mais baixo, e checará se há formação de gelo em rota. Não havendo gelo é gerada uma nova navegação com o nível de voo mais baixo e quantidade de combustível necessária para a etapa atualizada. Outro DOV, responsável por apresentar planos de voo, DLA e CHG irá apresentar uma CHG de nível de voo para aquela etapa. O piloto coordenador então enviará um documento ao Cmte do voo (algumas empresas chamam esse documento de Flight Status, outras de Trip Report), informando-o da liberação da aeronave e das restrições operacionais que ela acarreta.

Logo após a liberação concluída, o Trouble Shooting informa a coordenação o número máximo de dias que a aeronave poderá voar naquela condição e em quais locais há material disponível para que seja programada a parada para ação corretiva.

3. Em voo de cruzeiro, um passageiro desmaia a bordo

Logo após constatado que um passageiro passou e não há médico a bordo, o Cmte do voo entra em contato com o piloto coordenador, o informa da condição e informa a sua posição no momento e qual a sua escolha de alternado. O piloto coordenador, em contato com a coordenação, informa o fato e para qual aeroporto o voo irá se dirigir.

A coordenação, por sua vez já informa a base escolhida e solicita atendimento médico ao passageiro após o pouso.

4. Tripulação voando no limite da jornada de trabalho.

Após atrasos provocados por tráfego aéreo e meteorologia, o Cmte informa a escala de voos que sua tripulação não poderá efetuar a última etapa prevista em sua escala devido estar próximo ao limite máximo de jornada de trabalho. O escalador, após checar a programação da tripulação e constatar o fato, providencia a substituição da tripulação, enquanto os tripulantes regulamentados seguem para o hotel. Caso seja necessário atrasar o voo para aguardar outra tripulação, o escalador informa a coordenação, que irá analisar o trilho da aeronave para definir as mudanças necessárias para minimizar o atraso.

5. NOTAM de restrição de pista

Durante um turno de trabalho, o DOV NOTAM recebe a notificação de que a pista de um dos aeroportos que a empresa opera terá 200 metros de seu comprimento interditados para obras. Logo após constatar que aquele NOTAM terá impacto na operação da empresa, o DOV o envia para a Engenharia de Operações, onde será feita nova análise para definir o peso máximo de operação para aquele aeroporto e novas análises de pouso e decolagem serão geradas. Após emissão dos documentos, o engenheiro responsável pela confecção, os envia para o supervisor DOV para que sejam tomadas as devidas providências e se constatado que o impacto no payload dos voos daquela base é relevante, a engenharia envia os novos números máximos de passageiros ao departamento comercial, que irá restringir a venda de passagens naquele trecho.

O supervisor DOV então divulga as novas análises aos demais DOVs e informa das mudanças de payload e pesos máximos.

6. Aeroporto fechado por meteorologia

No fim da tarde de um típico dia de verão, uma chuva forte faz com que um aeroporto que a empresa opere feche devido condições meteorológicas.

Tão logo ocorra o fechamento, a coordenação é informada para definir as ações a serem tomadas, que pode ser reter os voos com destino aquele aeroporto na sua origem ou solicitar aos DOVs que os voos para aquele destino sejam despachados com adicional de combustível para efetuar espera na chegada. Para os voos que estejam chegando ao local durante o fechamento, a coordenação analisa junto as bases que podem receber os alternados qual a melhor alternativa para cada voo.

Muitas vezes, os voos alternam para locais diferentes do previsto no plano de voo original. Geralmente usa-se um alternado mais distante no planejamento e caso seja necessário alternar, o voo seguirá para um aeroporto mais próximo do destino onde causará menos impactos ao passageiros e malha da empresa.

Após definidos os alternados, os Cmtes dos voos são informados e seguirão para as localidades, enquanto a coordenação já analisa os trilhos das aeronaves para minimizar atrasos nos demais voos da empresa.

7. Fretamento

O departamento comercial da empresa recebe um pedido de orçamento de uma operadora de turismo para um voo fretado entre uma das bases da empresa e um local que não faz parte da malha de rotas. Tão logo definidas as datas, modelo de avião solicitado e número de passageiros a serem transportados, o departamento comercial envia os dados a Engenharia de Operações para análise da viabilidade. Após todas as análises de peso, payload e infraestrutura do aeroporto de destino e definição de alternados, a coordenação irá checar se há uma aeronave da frota que poderá ser disponibilizada no dia solicitado. A execução de escala também checará se há uma tripulação que poderá ser acionada para fazer voo. Caso a resposta seja afirmativa, o departamento comercial fecha o contrato. Após a confirmação do voo, a engenharia envia os documentos a um DOV que acompanhará o voo, a escala de voos aciona a tripulação e a coordenação seleciona uma aeronave para a operação. Logo após tais confirmações, todas as informações são enviadas ao gerente de Flight Standards e a chefia de pilotos, que convocará os tripulantes técnicos para efetuar um briefing a respeito da operação. O piloto coordenador recebe todas as informações a respeito do voo para auxiliar os demais setores do CCO e a tripulação técnica durante a execução do voo.

Como foi possível notar nos artigos da série Operações, muito pouco do que acontece durante um voo comercial pode ser visto pelos passageiros. Nesses exemplos práticos fica clara a integração entre todos os profissionais e como todos trabalham em conjunto para que um passageiro possa ir de uma cidade a outra sem percalços.

Da próxima vez que embarcar em um voo, apesar de não ver, tenha certeza que centenas e até milhares de profissionais foram necessários para que no horário previsto, seja iniciado o pushback do seu voo.

Philipe Pacheco
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