Quando se fala na história da Panair do Brasil, é inevitável pensar em duas coisas: dias de glória e grandes conspirações. Poucos são aqueles que viveram até os dias de hoje para contar, como testemunhas oculares dos fatos, a grandiosa história dessa companhia. Mesmo assim, não faltam evidências e relatos que comprovem por que muitos a consideram a maior companhia aérea brasileira de todos os tempos. A glória dos seus tempos áureos, no entanto, é tão grande quanto o mistério que envolve o abrupto encerramento de suas atividades.
A real criação da companhia deu-se ainda em 1929 sob o nome NYRBA, ou “New York, Rio and Buenos Aires Line”. Fundada pelo americano Ralph Ambrose O’Neill, a companhia foi criada com o intuito de concorrer com a Syndicato Condor, que com seu corpo diretivo composto por empresários alemães, dominava o mercado da aviação civil brasileira em sua época. O nome Panair do Brasil surgiu quando a companhia foi vendida à Pan Am, em 21 de Novembro de 1930.
A estratégia comercial da Panair consistia em explorar o potencial hidrográfico brasileiro, utilizando hidroplanos que pudessem pousar ao longo da costa brasileira, bem como na bacia do Rio Amazonas. A Syndicato Condor, por sua vez, apostava em aeronaves terrestres. Com a aquisição do Lockheed Electra pela Panair em Outubro de 1937, esta também pôde passar a operar em pistas de pouso convencionais, ampliando sua vantagem competitiva em relação à sua principal concorrente.
Mesmo já havendo atingido o título de companhia aérea brasileira com a mais extensa e abrangente malha aérea, a Panair consolidou-se à frente do mercado com o advento da Segunda Guerra Mundial. Com o Brasil ao lado dos Aliados, lutando contra o Eixo liderado pela Alemanha, a germânica Syndicato Condor sofreu sérias sanções governamentais. Passado o conflito, a Pan Am abriu mão da condição de acionista majoritária da empresa, ficando com apenas 48% de seu capital. Estando os restantes 52% nas mãos de investidores brasileiros, a Panair ganhou condições de receber a concessão para operações internacionais. Com isso, foi a primeira companhia aérea brasileira a chegar à Europa.
O amplo crescimento da Panair fez com que a companhia estabelecesse altos padrões de qualidade em suas operações, tornando-se uma referência de mercado. Na aviação brasileira, o termo “padrão Panair” tornou-se sinônimo do mais alto nível de qualidade em serviços aeronáuticos. Com sua excelência internacionalmente reconhecida, a companhia fez aparições em filmes famosos de sua época, como o ítalo-francês “Copacabana Palace”, e os franceses “La Peau Douce” e “L’homme de Rio”.
A Panair também foi responsável por operar o “Voo da Amizade”, em parceria com a TAP Portugal. Utilizando uma aeronave Douglas DC-7C, dedicada exclusivamente a essas operações e operada por tripulantes de ambas as companhias, a Panair oferecia voos interligando São Paulo, Rio de Janeiro e Lisboa, com passagens de baixo custo vendidas exclusivamente a cidadãos brasileiros e portugueses.
Apesar de seu crescimento exponencial e do orgulho que proporcionava à sua nação, a Panair do Brasil teve suas operações abruptamente interrompidas, sob circunstâncias até hoje pouco esclarecidas. O regime militar estabelecido em 1964, utilizando-se da truculência injustificada que foi sua marca registrada, inadvertidamente suspendeu as operações da companhia no ano seguinte. Aeronaves já embarcadas e prontas para decolagem foram abordadas por militares, anunciando aos passageiros que a licença de operações da companhia havia sido revogada. Aeronaves da Varig encontravam-se a postos para receber os passageiros e operar os mesmíssimos voos, revelando que esta última companhia teve acesso a informações privilegiadas, fornecidas pelo governo militar.
A falência decretada em 15 de Fevereiro de 1965 foi objeto de uma batalha judicial, que somente encontrou seu desfecho décadas depois. Em 14 de Dezembro de 1984, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a Panair encontrava-se em situação regular, tanto técnica quanto financeiramente, na ocasião do encerramento forçado de suas operações. A Comissão da Verdade, estabelecida em 2012 pelo governo brasileiro, propôs-se a investigar a violação de direitos humanos no processo de falência forçada da companhia. Atualmente, a companhia encontra-se oficialmente ativa, ainda que não existam operações aéreas de fato em andamento. Até os dias atuais, familiares de tripulantes da companhia seguem buscando indenizações pelos atos cometidos contra seus antepassados. Um triste fim para uma companhia que trouxe, para o Brasil, dias de glória jamais igualados.
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